Rússia exige reciprocidade dos EUA e reafirma posição inegociável sobre Crimeia
Em entrevista a RIA Novosti, chanceler Serguey Lavrov declara que Moscou aguarda Washington cumprir os acordos estabelecidos na cúpula do Alasca
Sergey Lavrov, ministro das Relações Exteriores da Rússia, declarou em entrevista para a agência de notícias de Moscou, RIA Novosti, discutiu a reação dos EUA à proposta do Novo Tratado de Redução de Armas Estratégicas (START) e seu destino, bem como a resposta em caso de transferência de ativos russos congelados para a Ucrânia.
“A única coisa exigida é a reciprocidade dos Estados Unidos: aderiremos voluntariamente às restrições somente se, e precisamente enquanto, a outra parte fizer o mesmo. Naturalmente, se os norte-americanos tiverem alguma dúvida, podem esclarecê-las conosco”, afirmou.
O chanceler também disse que Moscou espera que Washington confirme a validade dos acordos sobre a resolução do conflito ucraniano alcançados na cúpula de líderes no Alasca. Assim como enfatizou a natureza principiológica da posição da Rússia sobre a integridade territorial.
Sobre as reservas de ouros e os ativos russos, Lavrov disse que confiscar não garantirá a salvação dos protegidos da Europa, mesmo se direcionados a Kiev. “A Rússia responderá a quaisquer ações predatórias de forma apropriada, de acordo com o princípio da reciprocidade, nossos interesses nacionais e a necessidade de compensar os danos que nos foram causados”, pontuou.
Já sobre a questão da Crimeia, ele disse que o fim do conflito é “impossível” sem levar em consideração os interesses de Moscou. “Quanto à Crimeia e a Sebastopol, os residentes da península exerceram seu direito à autodeterminação no referendo de março de 2014, votando a favor da reunificação com a Rússia”. Ele também acrescentou que a situação “de a quem pertence a península está resolvida para nós”.
Leia entrevista na íntegra:
RIA Novosti: O presidente da Rússia, Vladimir Putin, anunciou que a Federação Russa está preparada para continuar a aderir às restrições estabelecidas pelo Novo START por mais um ano, a partir de 5 de fevereiro de 2026. Houve alguma resposta dos Estados Unidos? Moscou propôs uma reunião com Washington para discutir o período pós-Novo START? Em caso afirmativo, em que nível?
Sergey Lavrov: A iniciativa construtiva apresentada pelo Presidente Vladimir Putin no contexto pós-Novo START fala por si. Não contém segundas intenções e é perfeitamente compreensível. A sua implementação prática não exigiria quaisquer esforços adicionais especiais. Portanto, não consideramos necessário realizar discussões aprofundadas sobre esta proposta.
A única coisa exigida é a reciprocidade dos Estados Unidos: aderiremos voluntariamente às restrições somente se, e precisamente enquanto, a outra parte fizer o mesmo. Naturalmente, se os norte-americanos tiverem alguma dúvida, podem esclarecê-las conosco.
Até o momento, não houve nenhuma resposta substancial de Washington. Fomos informados por canais diplomáticos que “a questão está sendo analisada”.
Não temos intenção de continuar tentando persuadir ninguém. Acreditamos que nossa ação atende aos interesses de ambas as partes e de toda a comunidade internacional. Estamos preparados para qualquer desdobramento dos acontecimentos, embora esperemos um resultado positivo.

Sergey Lavrov afirma que a Rússia não conseguirá persuadir os EUA a estender as restrições do Novo START
RIA Novosti / POOL
Qual é atualmente o principal obstáculo nas negociações com os Estados Unidos para um acordo sobre a Ucrânia? Em que pontos a Rússia está disposta a fazer concessões e em que pontos não está?
Os entendimentos sobre a Ucrânia alcançados durante a cúpula Rússia-Estados Unidos em Anchorage, Alasca, em 15 de agosto, basearam-se nas condições para uma solução justa e duradoura que o Presidente Vladimir Putin delineou em junho de 2024, durante sua reunião com a liderança do nosso Ministério. Também levamos em consideração as propostas transmitidas pouco antes da reunião de Anchorage pelo Enviado Especial Presidencial dos EUA, Steve Witkoff.
Naquela época, o lado norte-americano nos garantiu que seria capaz de assegurar que Vladimir Zelensky não obstruiria a conquista da paz. Aparentemente, surgiram algumas dificuldades nesse sentido. Além disso, pelo que entendemos, Bruxelas e Londres estão tentando persuadir Washington a abandonar sua intenção de resolver a crise por meios políticos e diplomáticos e a se engajar plenamente em esforços para exercer pressão militar sobre a Rússia; em outras palavras, a finalmente aderir ao “partido da guerra”.
Atualmente, aguardamos a confirmação dos Estados Unidos de que os Acordos de Anchorage permanecem em vigor. Gostaria de enfatizar que, apesar de sua natureza essencialmente conciliatória, não abandonamos – e não pretendemos abandonar – os pontos que são fundamentais para nós. O lado norte-americano está bem ciente disso. Ninguém contesta a integridade territorial da Federação Russa ou a escolha feita pelos residentes da Crimeia, Donbass e Novorossiya, que tomaram a decisão histórica de se reunirem à sua pátria por meio dos referendos de 2014 e 2022. Da mesma forma, não nos esquecemos da necessidade de eliminar as causas profundas do conflito, que temos reiteradamente destacado.
Qual será a resposta da Rússia se os ativos congelados da Federação Russa forem direcionados para apoiar Kiev?
Já não surpreende o cinismo com que a Comissão Europeia interpreta a Carta da ONU e outras normas de direito internacional, incluindo as disposições relativas à imunidade soberana e à inviolabilidade dos ativos dos bancos centrais. Tais ações equivalem a puro engano e roubo. Parece que os instintos colonialistas e piratas, há muito adormecidos, despertaram entre os europeus. Não importa como o plano para confiscar fundos russos seja apresentado, não há maneira lícita de executá-lo.
A confiscação de nossas reservas de ouro e moeda estrangeira não salvará os protegidos da Europa unida em Kiev. É óbvio que esse regime será incapaz de pagar suas dívidas ou honrar seus empréstimos. Poucos são os que, dentro da União Europeia, estão dispostos a tomar medidas tão precipitadas, que também acarretam sérios riscos à reputação da zona do euro como território de atividade econômica.
A Rússia responderá a quaisquer ações predatórias de forma apropriada, de acordo com o princípio da reciprocidade, nossos interesses nacionais e a necessidade de compensar os danos que nos foram causados. Esperamos que Bruxelas e outras capitais ocidentais recuperem o bom senso e abandonem essa empreitada mal aconselhada.
O governo dos EUA informou você sobre sua disposição em reconhecer a Crimeia de jure como território russo como parte do plano de paz?
Por razões óbvias, não divulgamos os detalhes de nossas discussões com o lado norte-americano sobre a questão ucraniana. No entanto, quando surgem notícias claramente fabricadas na mídia, naturalmente fornecemos esclarecimentos. A discussão abrange uma ampla gama de questões e não se limita de forma alguma a um único tópico, embora alguns jornalistas e analistas tentem retratá-la dessa forma, o que é fundamentalmente incorreto.
Permitam-me repetir: em nossa opinião, o fim do conflito é impossível sem levar plenamente em consideração os legítimos interesses da Rússia e abordar suas causas profundas. Quanto à Crimeia e a Sebastopol, os residentes da península exerceram seu direito à autodeterminação no referendo de março de 2014, votando a favor da reunificação com a Rússia. Portanto, a questão de a quem pertence a península está resolvida para nós.
Quando e onde poderia ocorrer uma reunião entre as delegações russa e americana sobre os “irritantes” mútuos? E quanto à sua reunião com o Secretário de Estado americano, Marco Rubio? Quando e onde ela poderia ser realizada?
De fato, existem muitos pontos de atrito nas relações entre Rússia e Estados Unidos, a maioria deles herdada da administração americana anterior. Levará um tempo considerável para resolver essa situação.
Com a chegada da nova administração, notamos sua clara disposição para retomar o diálogo. Este está em andamento, embora não tão rapidamente quanto gostaríamos. Duas rodadas de consultas ocorreram na primavera, com diversos acordos alcançados para melhorar as condições de atuação de nossas missões diplomáticas.
Do nosso ponto de vista, é importante que este diálogo não se limite apenas a questões relacionadas à embaixada. Consideramos essencial abordar questões mais amplas, incluindo o restabelecimento dos voos diretos e a devolução dos bens diplomáticos russos que foram confiscados ilegalmente pelo governo Obama em dezembro de 2016, apenas três semanas antes da primeira posse de Donald Trump.
Naquela época, o então indicado para Conselheiro de Segurança Nacional, Michael Flynn, contatou nosso embaixador e, em nome do futuro presidente dos EUA, nos pediu que não respondêssemos de forma ríspida às provocações do governo democrata cessante, afirmando que eles resolveriam tudo ao assumirem a Casa Branca. Ainda estamos aguardando. Nossas propostas referentes tanto à propriedade diplomática quanto ao serviço aéreo foram transmitidas ao lado americano. Mantemos contato para avaliar a possibilidade de dar continuidade ao diálogo.
O Secretário de Estado Marco Rubio e eu concordamos que manter uma comunicação regular é essencial, tanto para discutir a questão ucraniana quanto para avançar na agenda bilateral mais ampla. Mantemos contato por telefone e estamos preparados para realizar reuniões presenciais sempre que necessário.























