Domingo, 7 de dezembro de 2025
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Em 26 de dezembro de 2004, um forte terremoto ocorreu no Oceano Índico. O tsunami que se seguiu matou pelo menos 220.000 pessoas, de acordo com um número oficial, mas sem dúvida subestimado.

Ouvido pela RFI, o especialista em tsunamis da Comissão Oceanográfica Intergovernamental da Unesco, Bernardo Aliaga, falou sobre a importância de manter viva a memória da catástrofe, deu conselhos e apontou as principais falhas que levaram à tragédia.

Primeiro vieram os tremores de terra, depois o horror. Pouco antes das 8h (hora local) do dia 26 de dezembro de 2004, a terra tremeu em Banda Aceh, no norte da Indonésia.

O terremoto de mais de 9 graus na escala Richter foi registrado em alto mar, a 250 quilômetros de distância. 30 minutos depois, ondas de mais de 30 metros atingiram a cidade.

Prédios, carros, transeuntes – o tsunami gigante varreu tudo em seu caminho.

Foi o desastre natural mais mortal da história e um dos piores da humanidade. O trauma ainda está muito presente na Tailândia, Sri Lanka e Indonésia, os países mais afetados, onde pelo menos 170.000 pessoas morreram.

Bernardo Aliaga, especialista em tsunamis da Comissão Oceanográfica Intergovernamental da Unesco, fala sobre a importância de manter viva a memória da catástrofe.

“Nossa memória se apaga com o tempo. É preciso um trabalho contínuo para lembrar às gerações, antigas e futuras, da tragédia. A primeira regra a aprender é que onde teve um tsunami haverá outro tsunami, há 100% de probabilidade”, alertou à RFI.

O especialista também aponta para a falta de preparação de 20 anos atrás. Ele lembra “a falta de cooperação entre as agências”, especialmente entre os cientistas e os responsáveis pelo gerenciamento de desastres.

“Em 2004, não havia nada no Oceano Índico, nem no Mediterrâneo. O tsunami no Oceano Índico provocou um aumento nessa cooperação. Não foi apenas a cooperação internacional e humanitária que foi posta em prática, mas também a cooperação política e científica (…) com o nobre objetivo de salvar vidas”, afirma.

Cinco minutos hoje para detectar um terremoto

Aliaga acredita que “reconhecer os sinais de alerta” e “fazer exercícios [de simulação]” para evacuar as pessoas são essenciais: “se você estiver na costa e um terremoto fizer você cair de joelhos no chão, ou se o tremor for muito longo – mais de um minuto – você tem que correr porque em 10 ou 12 minutos você terá a primeira onda, e ela não será a mais perigosa. A segunda ou terceira onda, 20 a 30 minutos depois, serão realmente perigosas. Por isso, você deve correr para um lugar alto imediatamente”, insiste o especialista.

“Hoje estamos muito melhor preparados contra um tsunami em todas as partes, no Pacífico, Índico e Mediterrâneo. Países como Portugal, Grécia, Itália e Espanha estão muito melhor preparados. Na Europa, há uma comunidade que se chama Rede Tsunami, mas tem também estruturas em Galápagos, Costa Rica, Equador, El Salvador. Se compararmos tecnicamente com o que houve em 2024, estamos muito melhor preparados”, acredita. “De 50 minutos a uma hora para dar um alerta desse tipo, passamos para 5 a 7 minutos. De 150 sismógrafos para detectar um terremoto disponíveis na rede mundial, passamos a alguns milhares”, explicou.

Cidade de Banda Achém destruída após o tsunami em 2004

Philip A. McDaniel / Wikimedia Commons
Cidade de Banda Achém destruída após o tsunami de 2004

“Cheiro de carniça”

Há 20 anos, a onda de choque se alastrou rapidamente. Pouco menos de duas horas após o terremoto, as costas do Sri Lanka, Birmânia e Tailândia foram atingidas, especialmente na região turística de Phuket, na Tailândia.

Várias testemunhas relataram o horror aos jornalistas da RFI presentes no local em 2004: “foi o barulho que nos alertou. Quando saímos para ver o que era aquele estouro enorme, já era tarde demais. Não havia nada que pudéssemos fazer”, confidenciou uma delas.

Um outro morador acrescentou, na época: “há pessoas mortas por toda parte, ao longo das estradas. Os corpos foram levados pela água”.

Índia, Bangladesh, Cingapura…. As ondas atingiram praias tão distantes quanto a Tanzânia, trazendo a morte com elas.

Mas foi em Banda Aceh que os danos foram mais graves. No dia seguinte ao tsunami, a correspondente da RFI, Jocelyn Grange, relatou o caos: “a situação dentro da cidade não é tão catastrófica quanto ontem, quando várias centenas de corpos estavam espalhados pelas calçadas. Ainda há muitos corpos nas ruas. E há também o cheiro de carniça…”, constatou.

A falta de água, de alimentos e as epidemias fizeram com que a tragédia durasse mais do que o próprio desastre. Além dos mais de 220.000 mortos, dois milhões de pessoas ficaram desabrigadas.

Ausência de sistemas de alerta

O trauma nunca desapareceu para aqueles que viveram o tsunami de 2004. O morador Pradeep Kodippilii declarou que “o sofrimento está em toda parte. As pessoas falam sobre aquele momento chorando”.

O cingalês comemorava o Natal na casa de sua esposa, em um vilarejo a poucos quilômetros da costa, quando ocorreu a tragédia. “Lembro-me daquele dia, a manhã de 26 de dezembro. Minha mãe me ligou e disse: ‘Aconteceu algo no mar’”.

Kodippilii correu então para a casa de sua mãe, à beira-mar. “Ouvi um barulho… O rugido abafado do mar, como o de um avião de caça. E então me virei. Fui arrastado, minhas pernas se quebraram, mas consegui pegar uma pá. Um de meus amigos, que tentou escapar, morreu. Bem ali, diante de meus olhos”, testemunhou.

O tsunami mudou a vida de Kodippilii: nos últimos 20 anos, ele vem trabalhando na prevenção no Centro de Gerenciamento de Desastres Naturais do Sri Lanka.

Em 2004, a falta de um sistema de alerta eficaz e de conscientização do público custou centenas de milhares de vidas.