Na ONU, Milei afaga Trump e diz que tarifaço é ‘reestruturação do comércio internacional’
Em discurso na Assembleia Geral, presidente argentino promoveu agenda neoliberal e atacou Nações Unidas
O presidente da Argentina, Javier Milei, discursou na 80ª Sessão da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), nesta quarta-feira (24/09). Em sua fala, elogiou o governo dos Estados Unidos, liderado pelo republicano de extrema direita Donald Trump, e disse que as tarifas impostas por Washington a outros países significam “reestruturar os termos do comércio internacional de uma forma sem precedentes”.
O mandatário argentino, aliado de Trump, disse que o norte-americano “entende que chegou a hora de reverter uma dinâmica que está levando os EUA a um desastre”, que também é “um desastre global”.
“Ele [Trump] sabe que deve fazer o que é necessário, mesmo que muitos não gostem, antes que seja tarde demais. Em outros países, por exemplo, já é tarde demais para tomar as decisões que ele tomou”, declarou.
Discurso del Presidente Javier Milei en la 80° sesión de la Asamblea General de la ONU en Nueva York. pic.twitter.com/UzANPLNBWl
— Oficina del Presidente (@OPRArgentina) September 24, 2025
Milei ainda chamou a política econômica de Trump de “tarefa titânica que atinge o cerne do sistema econômico global”, identificando que esse “sistema tem corroído o coração industrial” dos EUA.
O presidente argentino afirmou que essa lógica é a responsável pela “crise de dívida sem precedentes”, referindo-se à dívida externa norte-americana, a maior do mundo em valores absolutos, que é de cerca de U$25 trilhões (R$140 trilhões).
“Tanto eu quanto Donald Trump sabemos o que estamos fazendo diante desses desafios. Todos esses desafios têm um denominador comum que todos os países, incluindo organizações supranacionais, devem enfrentar. Eles devem encontrar uma maneira de criar dividendos para o futuro e não sucumbir à tentação de lidar com o presente. Isso é algo que as grandes nações, as nações ocidentais, estão cientes e colocam em prática há décadas”, disse ainda.
Milei também elogiou a política “bem-sucedida” de Trump em “deter a imigração ilegal” nos Estados Unidos, mesmo que a maior parte dos alvos sejam latino-americanos, e disse que o republicano também “está empreendendo uma limpeza da captura institucional do Estado [norte-]americano”.
Segundo o argentino, os EUA foram “infiltrados por facções de esquerda que buscavam minar qualquer programa de reforma que fosse necessário” no país. A declaração de Milei ocorre em um momento em que o governo Trump silencia seus opositores, na esteira da morte do influenciador conservador Charlie Kirk.
Promoção da economia neoliberal
Referindo-se à economia de seu país, Milei rechaçou os debates mundiais sobre distribuição de riqueza, afirmando que essa pauta “ignora a necessidade de acumular riqueza para o amanhã”.
Falando sobre crescimento econômico, disse que “o povo argentino sabe muito sobre essa questão” por ser “o único país da região que não teve crescimento nos últimos 15 anos”, atacando os governos progressistas argentinos que o precederam.
Também aproveitou a oportunidade para dizer que “em termos jurídicos, a condição para o crescimento é respeitar a santidade da propriedade e o livre mercado”, em uma promoção de sua agenda neoliberal.

Em seu discurso, Milei acusou ONU de “abuso de autoridade”
UN Photo
“E isso significa nada mais do que garantir o livre comércio e a livre cooperação entre pares, sem o direito à propriedade não pode haver poupança e sem poupança ou livre comércio, não há investimento. Se não há investimento, não pode haver crescimento”, compreendeu.
Ao defender sua política econômica, disse que o Estado “erode as liberdades individuais dos cidadãos”.
“Essa é a grande armadilha à qual todas as nações estão sucumbindo. Quando esse processo continua, o crescimento estagna. Quando o crescimento estagna, a demanda por redistribuição de riqueza se torna cada vez mais forte. Assim, as políticas populistas se tornam cada vez mais fortes. Essas políticas apelam para a inveja e o ressentimento. E a conclusão final desse processo é se os jovens vulneráveis sufocam sob o peso de um Estado que eles sabem que existe apenas para explorá-los”, analisou.
Neste tema, Milei ainda disse que “a expansão fiscal, a expansão monetária e a expansão do poder estatal estão sufocando os indivíduos”.
Ataque à ONU
Em seu discurso, Milei ainda atacou a ONU, afirmando que em vez de “retornar às ideias de liberdade”, as Nações Unidas se transformaram em uma organização “que afirma não só decidir o que cada Estado-nação deve fazer, mas também o que todos os indivíduos, onde quer que estejam no mundo, devem fazer”.
O presidente argentino disse “acreditar no objetivo e propósito originais” da ONU em incentivar o diálogo e a cooperação internacional para resolver problemas globais, mas acusou a organização de “abuso de autoridade” para chegar a tais objetivos.
“Com o passar dos anos, essa organização adquiriu responsabilidades que vão contra seu espírito fundador. Ela criou camadas e mais camadas de organizações, agências e programas até alcançar essa hipertrofia de administrações que são pouco eficazes quando se trata de resolver os problemas para os quais foram criadas”, opinou, criticado “os resultados bastante reduzidos” da ONU.
Milei usou do cenário que expôs para justificar o motivo pelo qual a Argentina “decidiu se afastar” das metas da ONU na Agenda de 2030, um plano de ação global estabelecido em 2015 que envolve pautas sociais, ambientais e econômicas.
O presidente de extrema direita ainda afirmou que a Argentina viu “as consequências naturais de proceder desta forma”: “Em outras palavras, o que estou dizendo é que estamos falando com vocês de um futuro que ainda não chegou para vocês”.
“O que estamos fazendo se opõe ao resto da política. Essa política nos pede para fazer o que todos fizeram durante anos e o que nos levou ao declínio, nos pede para comprometer nosso futuro para atender às demandas atuais”, discursou.
Milei disse ainda estar ciente de que “muitos não compartilham” de suas opiniões. Mas defendeu ser “preferível dizer uma verdade incômoda do que uma mentira reconfortante”.























