Londres e Paris anunciam acordo inédito desde Brexit sobre fluxo imigratório
Visita de Macron ao Reino Unido foi a primeira de um líder europeu após desligamento do país da União Europeia
O primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, e o presidente da França, Emmanuel Macron, concordaram em fortalecer as parcerias entre os dois países no combate à imigração em situação irregular e em questões de defesa. O francês encerrou nesta quinta-feira (10/07) uma visita de Estado de três dias a Londres, a primeira de um líder europeu ao Reino Unido desde o Brexit, formalizado em janeiro de 2020.
A saída de Londres do bloco europeu prejudicou os laços franco-britânicos. Emmanuel Macron destacou o “entendimento amigável” entre os dois países, mas não deixou de pontuar a “mentira vendida” ao povo britânico sobre a imigração na época da saída do país da União Europeia.
O tema foi uma preocupação central dos defensores do Brexit, mas a questão da imigração continua sendo um grande problema para Londres, já que o número de travessias ilegais do Canal da Mancha atinge níveis recordes e causa tensões entre britânicos e franceses.
Macron lamentou um “incentivo” à travessia do Canal da Mancha desde o Brexit, explicando que não existe mais “nenhum acordo de migração com a União Europeia”.
“Para aqueles que desejam atravessar, não há uma rota legal alternativa de admissão nem um mecanismo de readmissão após a travessia, e a situação atual, na verdade, cria um incentivo para fazer a travessia”, declarou o presidente, durante uma coletiva de imprensa conjunta com o primeiro-ministro britânico, após a 37ª cúpula franco-britânica.

Primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, e presidente francês, Emmanuel Macron, tiveram série de reuniões nesta quinta-feira (10/07), em Londres
Reproducão X / @EmmanuelMacron
Com baixa popularidade, premiê mira a imigração
Keir Starmer, cuja popularidade diminuiu desde sua vitória esmagadora nas eleições gerais de julho de 2024, pretende avançar no combate ao fluxo de migrantes. Muitos deles tentam chegar à costa britânica a bordo de embarcações precárias que partem no norte francês.
Starmer e Macron anunciaram um projeto piloto não quantificado, que faria com que um migrante que chegasse em um pequeno barco fosse devolvido à França em troca de outro migrante que poderia vir ao Reino Unido legalmente, desde que tenha laços com o país.
“Resolveremos isso trabalhando juntos”, declarou o primeiro-ministro britânico. “Pela primeira vez, migrantes serão detidos e devolvidos à França em curto prazo”, acrescentou ele, durante a coletiva.
Um programa piloto será implementado pelos dois países “nas próximas semanas”, anunciaram os dois líderes, com base no princípio “um por um”, para usar a expressão usada pelo presidente francês.
Desde o início do ano, mais de 21 mil migrantes cruzaram o Canal da Mancha, um aumento de 48% em relação ao ano anterior e um recorde que pode levar Paris a alterar as regras para permitir que as autoridades interceptem barcos a até 300 metros da costa — onde o direito marítimo internacional proíbe qualquer ação depois que um barco estiver na água.
Estas são decisões “fortes e novas”, enfatizou Macron, ao saudar o fato de Paris e Londres estarem trabalhando “de mãos dadas” – como se buscasse virar definitivamente a página do Brexit.
Segurança e defesa
O discurso de reaproximação também se aplicou a questões de segurança e defesa, no contexto da guerra na Ucrânia, que entrou em seu quarto ano em fevereiro passado, e às dúvidas sobre a continuidade do apoio dos Estados Unidos à segurança desde o retorno ao poder do presidente americano Donald Trump. O republicano está pressionando os europeus a investirem mais em sua defesa.
Em uma importante mudança estratégica, 30 anos após a doutrina “Chequers”, o Reino Unido e a França assinaram uma declaração conjunta na quinta-feira, estabelecendo a possibilidade de coordenar suas capacidades de dissuasão nuclear diante de “novas ameaças”.
Qualquer adversário que ameace os “interesses vitais” dos dois países poderá ser confrontado com o poder combinado de suas capacidades nucleares. O Reino Unido e a França são os únicos países da Europa Ocidental a possuir armas nucleares. Para isso, será criado um “grupo de supervisão nuclear” sob copresidência franco-britânica.
Além dessa revisão da doutrina militar, Paris e Londres concordaram em “fortalecer” a Força Expedicionária Conjunta (CJEF), criada em 2010 em preparação para possíveis intervenções na Europa. A CJEF se tornará um corpo de exército com tropas de até 50 mil homens – muito além da atual brigada.
Guerra na Ucrânia
Emmanuel Macron afirmou na quinta-feira que essa possível coordenação das forças de dissuasão nuclear é “totalmente separada” dos esforços feitos pelos dois países para apoiar a Ucrânia em sua guerra contra a Rússia. França e Reino Unido pretendem se tornar o “porto” de segurança do continente europeu, disse o presidente francês, observando que o Reino Unido ocupa um lugar “único” na Europa, mas que “ameaças institucionais (…) não têm fronteiras”.
Uma reunião por videoconferência ocorreu nesta quinta-feira com a participação dos Estados Unidos, presidida pelo primeiro-ministro britânico e pelo presidente francês, na base aérea de Northwood, perto de Londres.
Keir Starmer retomou a ideia de uma “força de segurança” em caso de de um cessar-fogo entre a Rússia e a Ucrânia, com uma coalizão de voluntários envolvidos na segurança do espaço aéreo ucraniano, das zonas marítimas e na regeneração das tropas terrestres de Kiev.
Com informações da Reuters e AFP























