Kim Jong Un descarta desnuclearização, mas sinaliza possível encontro com Trump
Líder norte-coreano enfatizou que poder bélico 'é lei do país' e que diálogo com EUA será viável caso abandonem 'obsessão absurda' pela retirada de armas nucleares
“Nunca abandonaremos as armas nucleares”, garantiu o líder da Coreia do Norte, Kim Jong Un, em um extenso discurso proferido na 13ª sessão da Assembleia Popular Suprema do país ao longo deste fim de semana, conforme divulgou a agência estatal KCNA nesta segunda-feira (22/09). A reunião contou com a presença dos delegados da Assembleia Popular Suprema e funcionários relevantes do Comitê Central do Partido dos Trabalhadores, além do Gabinete, dos Ministérios e das Forças Armadas.
De acordo com o chefe de Estado, o fortalecimento bélico se consolida como uma ferramenta em prol da sobrevivência norte-coreana, e entende que a “desnuclearização” pregada pelos Estados Unidos, que faz uso da Coreia do Sul para atingir seus objetivos, é um ato inconstitucional que fere a soberania nacional.
“Ainda existem muitas forças que simpatizam com o decreto de ‘desnuclearização’ defendido pelos Estados Unidos. Essas forças estão ignorando a soberania da República Popular Democrática da Coreia e violando-a gravemente. Faríamos inconstitucionalidade? Gostaríamos de ‘desnuclearizar’? Para que retirem as sanções? De jeito nenhum”, disse Kim. “Mesmo que os Estados Unidos e seus aliados cantem ‘desnuclearização’ por 10, 20, 50 ou 100 anos, o fato do nosso país possuir armas nucleares permanecerá inalterado, gostem ou não. Nossa posse de armas nucleares é lei do país, e temos a obrigação de defendê-la”.
Em sua fala, o líder norte-coreano enfatizou que a narrativa dos países hegemônicos que defendem o abandono das armas nucleares pelo bem-estar do mundo já perdeu credibilidade. “O mundo já sabe o que os Estados Unidos farão depois de desarmar”, acrescentou.
Ao mencionar a nova gestão da Coreia do Sul, liderada por Lee Jae Myung – que em 25 de agosto teve um encontro com o norte-americano Donald Trump com foco no estreitamento das relações bilaterais nas áreas de defesa e comércio – e as medidas tomadas pela Casa Azul visando negociações para aliviar as tensões na península coreana, Kim destacou que tais esforços nada mais são do que um disfarce de “sua verdadeira natureza” de enfraquecer as instituições norte-coreanas.
“Não muito tempo atrás, eles criaram o conceito de ‘desnuclearização em fases’ e, com isso, destruíram a justificativa e o fundamento para nos enfrentar com suas próprias mãos”, reiterou.
Em recente entrevista à BBC, Lee também sugeriu como alternativa o congelamento de armas por parte de Pyongyang, descrevendo a medida como uma “opção prática e realista” ao apontar que acredita que a nação vizinha esteja produzindo de 15 a 20 ogivas por ano. “Se Trump e Kim concordarem com um congelamento em vez de um desmantelamento total, a Coreia do Sul pode aceitá-lo”.
Possível diálogo com Trump
Para Kim, seria viável um diálogo com seu homólogo norte-americano Trump caso os EUA abandonem “sua obsessão absurda com a desnuclearização”. Especialistas ouvidos por Opera Mundi também já indicaram essa possibilidade devido ao caráter imprevisível do republicano quando se trata de sua gestão diplomática.
“Não há razão para que não possamos”, destacou, lembrando que compartilhou de “boas lembranças” com o magnata, com quem teve três encontros anteriores. Ainda segundo Kim, seria também uma oportunidade para reforçar o posicionamento norte-coreano frente às relações com o Sul. “Não nos sentaremos cara a cara com a Coreia do Sul e não faremos nada juntos”, assegurou.
Vale lembrar que durante a cúpula com Lee em agosto, Trump já disse que se dava bem com o norte-coreano e expressou sua vontade de vê-lo “dentro de um ano”.
Segundo a mídia sul-coreana, a expectativa é de que esse possível encontro aconteça à margem da Cúpula da Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (Apec), a ser realizada em Gyeongju, na Coreia do Sul, no final de outubro. Embora as chances de Kim participar do evento sejam baixas, os comentários recentes do norte-coreano restauram a possibilidade de um diálogo com o republicano, provavelmente na fronteira.
Em seu discurso na Assembleia, o líder norte-coreano ainda citou um recente orçamento aprovado pela gestão sul-coreana de Lee para o próximo ano, que reflete um aumento nos gastos militares em 8,2%, sendo maior do que o antecessor de extrema direita Yoon Suk Yeol, conhecido por seus discursos confrontantes com a Coreia do Norte.
“Nada mudou na essência. Usando termos de ambição na ‘reunificação’, [a atual Coreia do Sul] ofusca os regimes ‘conservadores’ viciosos anteriores que definiram a política antirrepublicana como sua política nacional”, ressaltou.

Líder norte-coreano Kim Jong Un durante discurso na 13ª sessão da Assembleia Popular Suprema
KCNA
Uma coexistência pacífica
Em entrevista à agência Reuters, publicada também nesta segunda-feira, o presidente Lee Jae Myung enfatizou que a Coreia do Sul precisa trabalhar tendo como foco o estabelecimento de relações pacíficas com a Coreia do Norte, Rússia e a China.
O mandatário sul-coreano mencionou um confronto entre “o campo socialista e o campo capitalista”, indicando que a posição geográfica de sua nação ameaça colocá-la na fronteira de qualquer conflito. Segundo ele, há “uma espiral crescente de rivalidade e tensão”, dentro da qual Seul, Tóquio e Washington “aprofundam a cooperação” à medida que Pyongyang, Moscou e Pequim trabalham mais juntos.
“Devemos encontrar um caminho para a coexistência pacífica”, acrescentou.
Ao concordar com a avaliação de seu antecessor Yoon Suk Yeol, de que uma gradativa cooperação militar entre Coreia do Norte e Rússia escala a ameaça contra o seu país, defendeu que tal desafio deve ser enfrentado por meio do diálogo. Contudo, Lee ressaltou que não estar “otimista” sobre a possibilidade de negociações entre Seul e Pyongyang.
Durante sua campanha eleitoral, o presidente da Coreia do Sul prometeu aliviar as tensões com o país vizinho. Ao longo dos primeiros meses assumindo a Casa Azul, aplicou medidas como a retirada de propaganda anti-Coreia do Norte na zona desmilitarizada, o adiamento de exercícios militares com os soldados norte-americanos e a pretensão em assumir autonomia do chamado “OPCOM”, o controle operacional sobre as forças armadas do país, atualmente assumido pelos EUA.
Entretanto, Pyongyang negou a possibilidade de um diálogo, uma vez que Seul segue fortemente atrelada aos interesses essenciais de Washington. Durante encontro bilateral com Trump, Lee considerou o magnata como “a única pessoa” que poderia apaziguar as relações entre as Coreias.























