Intervenção de Trump: 'crime é pretexto para ocupação militar', diz jornalista do NYT
Para Jamelle Bouie, republicano visa 'tomar o máximo de poder possível para governar os EUA'; 450 pessoas já foram presas, segundo Casa Branca
A intervenção do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, nas forças de segurança de Washington divide opiniões. Em declaração ao The Guardian, um funcionário da Casa Branca afirmou que mais de 450 prisões foram realizadas pelas forças militares desde o dia 12 de agosto, quando Trump assumiu o controle da polícia local e deslocou o efetivo da Guarda Nacional para atuar na região.
Segundo o funcionário, neste período, 68 armas de fogo foram apreendidas e três membros conhecidos de gangues foram presos. Além disso, 48 acampamentos de moradores sem-teto foram desmontados. Em paralelo, o escritório da procuradora dos EUA do Distrito de Columbia, Jeanine Pirro, vem promovendo uma investigação criminal contra a polícia de Washington DC.
O argumento é de que a política local manipulou sistematicamente estatísticas para transmitir a impressão de que a cidade era mais segura do que realmente é. Para rechaçar a tentativa de Trump de assumir o controle da corporação, a prefeita da capital federal, Muriel Bowser, tem usado dados da polícia de Washington que apontam uma redução de 27% nos crimes violentos em 2024. O sindicato da polícia, porém, contesta as estatísticas e denuncia diretrizes internas para reduzir artificialmente os índices.
Ocupação militar
Nem todos, porém, estão de acordo com a intervenção na capital federal. Em artigo publicado no New York Times, intitulado “O que Trump realmente está fazendo em Washington” o colunista do jornal, Jamelle Bouie, sustenta que a ocupação não tem como real objetivo enfrentar a criminalidade, mas sim projetar poder e enfraquecer a autonomia da capital.
“O crime é um pretexto — e não a principal razão — para a ocupação militar de Washington por agentes federais e soldados da Guarda Nacional”, escreveu. Segundo Bouie, se o presidente estivesse verdadeiramente interessado em reduzir a violência urbana, adotaria medidas práticas como pressionar os republicanos da Câmara para restaurar o corte de US$ 1 bilhão feito no orçamento da cidade, verba essencial para manter o efetivo completo do Departamento de Polícia Metropolitana e custear serviços básicos de segurança.
Outra medida seria preencher as vagas existentes no gabinete do procurador dos EUA em Washington e no Tribunal Superior local, acelerando os processos judiciais, apontou.

‘Crime é um pretexto — e não a principal razão — para a ocupação militar de Washington’, avalia colunista do NYT
Daniel Torok / White House
Espetáculo
Ao avaliar a intervenção federal, Bouie sintetizou com a fala de um dos moradores do Ward 8, bairro com os maiores índices de mortes violentas da capital, dita ao New York Times: “se Trump estivesse genuinamente preocupado com a segurança dos residentes de DC, eu veria a Guarda Nacional no meu bairro. Não estou vendo isso e não espero ver. Não acho que Trump esteja trazendo a Guarda Nacional para proteger bebês negros no sudeste.”
O depoimento, aponta Bouie, revela a contradição central da ocupação: enquanto bairros de alta criminalidade seguem sem reforço policial, soldados patrulham pontos turísticos como o National Mall, veículos blindados estão estacionados na Union Station e agentes do ICE montam barreiras em áreas de bares e restaurantes. “Eles não estão lá pela segurança, mas para exibição”, pontuou.
Bouie também alerta sobre a ameaça presidencial de expandir a medida a outras cidades governadas por democratas, traçando um paralelo da medida com a Guerra Civil. No entanto, se naquele período, a ocupação do Sul pelo Exército da União visava reconstruir e reintegrar os ex-confederados ao país, ampliando os direitos de cidadania; agora, pelo contrário, a ocupação “diz ao povo de Washington — e de outras cidades semelhantes — que eles são cidadãos menos iguais sob um governo eleito, tratados como súditos de um governante caprichoso”, afirmou.
Ainda que a militarização da capital seja “para espetáculo”, o colunista do NYT afirma que ela não deve ser vista como simples distração. “Enquanto encena um show, Trump está fazendo tudo o que pode para alcançar seu objetivo final”, no caso, “tomar o máximo de poder possível para governar os Estados Unidos como um homem forte”.
Leia a íntegra no The New York Times























