EUA não têm como isolar bloqueio do GPS apenas no Brasil, afirma especialista

Vem circulando desde o fim de semana nas redes sociais, especialmente dentro da bolha bolsonarista, uma teoria de que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, estaria cogitando a possibilidade de cortar o acesso do Brasil ao sistema de georreferenciamento satelital Global Positioning System (GPS).

Uma medida dessa magnitude afetaria diversos serviços online que necessitam do georreferenciamento para poder funcional, atingindo desde a aviação comercial até os serviços de entrega e de transporte por aplicativos, entre vários outros.

No entanto, segundo o professor Amadeu professor da Universidade Federal do ABC (UFABC), seria impossível adotar uma medida contra o funcionamento do GPS no Brasil sem afetar outros países.

“O Trump tem poder para interferir no GPS, mas a coisa não é tão simples como está sendo dito nessas teorias, porque se ele alterar a precisão do GPS, isso não isolaria somente o Brasil, teria efeitos no mundo inteiro”, explica o acadêmico, formado em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP) e criador do podcast Tecnopolítica.

Em entrevista a Opera Mundi, Amadeu afirma que “se ele (Trump) mexer no Brasil, vai afetar uma ampla região, não é algo que ele pode controlar dessa forma, de isolar somente o Brasil. É parecido ao que acontece com o sinal de wifi, que você não tem como fazer ele funcionar apenas dentro do seu apartamento”.

“Ele não tem como desligar o GPS apenas para o Brasil sem afetar uma série de outros países da América do Sul, e sem gerar outros problemas para muitos serviços importantes, como a aviação, em uma escala global”, acrescenta o professor que é um dos principais especialistas em comunicação digital do país.

Trump tem cogitado adotar medidas de pressão contra o Brasil para beneficiar seu principal aliado no país, o ex-presidente Jair Bolsonaro
Casa Branca

A teoria difundida nas redes bolsonaristas alega que tal medida seria adotada caso o Brasil não derrube as medidas judiciais impostas recentemente ao ex-presidente Jair Bolsonaro, que reponde como réu em processo no Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe de Estado, e que na última sexta-feira (18/06) passou a usar uma tornozeleira eletrônica após medida cautelar imposta pela mesma corte.

Amadeu também frisou que “os Estados Unidos poderiam realizar outro tipo de ação de guerra cibernética no Brasil, afetando o sinal de internet em determinadas regiões do país, mas para isso seria necessária uma declaração aberta de guerra, que não é o que está posto no momento, e também exigiria bases norte-americanas postadas próximas às regiões onde haveria essa interferência de sinal, e eu não acho isso viável”.

Outros sistemas

A reportagem de Opera Mundi também indagou o acadêmico Sergio Amadeu sobre as alternativas que o Brasil teria caso o sistema GPS deixasse de operar no Brasil.

Nesse sentido, o sociólogo ressaltou que o GPS não é o único sistema de georreferenciamento satelital disponível no país, e lembrou do Galileo, que é um serviço europeu acessível através dos celulares desde 2018, e que é de controle civil – diferente do GPS, que é operado por instituições militares que respondem ao Departamento de Defesa dos Estados Unidos.

“A partir de 2018, os celulares brasileiros passaram a contar com chips multi-GNSS (sigla para Sistema Global de Navegação por Satélite), o que significa que suportam múltiplos sistemas de georreferenciamento, ou seja, podem utilizar o Galileo, o Glonass russo, ou o BeiDou chinês”, comenta Amadeu.

Segundo o professor da UFABC, “se o Trump decidir mesmo impulsionar uma medida contra o uso do GPS no Brasil, o que na prática vai afetar pelo menos toda a América do Sul, seria uma coisa completamente maluca, porque se ele fizer isso o GPS vai perder espaço para os outros sistemas. O sistema Galileo, por exemplo, é muito mais preciso que o GPS, e já está no nosso celular”.