Sábado, 6 de dezembro de 2025
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A crise entre Estados Unidos e Venezuela atingiu um novo patamar nesta sexta-feira (05/09), após a ordem do presidente Donald Trump para deslocar dez caças F-35 para Porto Rico, território norte-americano no Caribe.

A movimentação, confirmada pelo Pentágono e pelo Departamento de Estado, ocorre sob a justificativa de combate ao narcotráfico, mas reforça temores de confronto direto com Caracas.

O envio das aeronaves representa uma escalada qualitativa na presença militar dos EUA na região, que já contava com sete navios de guerra e 4.500 fuzileiros. Trata-se de jatos de quinta geração, especializados em ataques terrestres, cuja utilização sugere a possibilidade de operações ofensivas contra alvos em solo venezuelano.

Até aqui, a atuação norte-americana contra o tráfico de drogas se dava em cooperação com forças nacionais, não de forma isolada e com poder bélico desse porte.

Na terça-feira (02/09), Trump anunciou a destruição de uma embarcação que, segundo Washington, transportava drogas da Venezuela para os EUA.

O ataque deixou 11 mortos e gerou questionamentos sobre sua legalidade, já que não houve abordagem policial antes da explosão do barco. O governo Maduro contestou o episódio e classificou como falsa a gravação divulgada pela Casa Branca.

O ambiente tornou-se ainda mais instável na noite de quinta-feira (04/09), quando dois caças F-16 venezuelanos sobrevoaram o destróier americano Jason Dunham, estacionado próximo ao litoral.

O gesto foi interpretado como provocação, mas também revelou a saturação militar na região, com alto risco de incidentes capazes de deflagrar um conflito aberto.

Venezuela denuncia pretexto e exibe dados antidrogas

Apesar da retórica de Trump, que classifica Nicolás Maduro como “chefão de um narco-Estado”, o governo venezuelano tem utilizado números oficiais e verificáveis para rebater a acusação.

O ministro da Defesa, Vladimir Padrino López, afirma que o país neutralizou 402 aeronaves vinculadas ao tráfico de drogas em operações militares realizadas em zonas de fronteira.

Segundo dados do Ministério Público venezuelano, entre 2017 e 2025 foram processadas 131.893 pessoas por delitos relacionados a drogas. Desse total, 61.690 foram denunciadas, 49.947 acusadas e 20.256 condenadas.

No mesmo período, foram apreendidos mais de 365 mil quilos de entorpecentes, incluindo 280 mil quilos de cocaína, 83 mil de maconha e 793 de heroína. “A Venezuela não foi nem será rota para o tráfico ilícito de drogas”, declarou Padrino.

O presidente Nicolás Maduro afirmou que apenas 5% da droga produzida na Colômbia tenta cruzar o território venezuelano, e que 70% desse volume é interceptado pelas autoridades.

“Estou seguro de que vamos chegar a 100%, livres da passagem de qualquer tipo de drogas”, disse.

Movimentação ocorre sob justificativa de combate ao narcotráfico, mas reforça temores de confronto direto com Caracas
Reprodução

Relatórios recentes da ONU corroboram a versão oficial, ao apontar que a Venezuela está livre de cultivos ilícitos há 15 anos.

O procurador-geral Tarek William Saab acrescentou que até a DEA, agência antidrogas norte-americana, reconhece que o país não é produtor, mas apenas rota marginal de uma fração do narcotráfico colombiano.

Para Caracas, a insistência dos EUA em acusar a Venezuela de ser um “narco-Estado” não passa de pretexto político para justificar a escalada militar no Caribe.

Conflito sem declaração de guerra e pressões internas nos EUA

A decisão de Trump tem gerado debates sobre a legalidade das ações militares. Ao atacar uma embarcação sem autorização do Congresso, os EUA realizaram um ato de guerra contra um país com o qual não há conflito declarado.

Organizações como a Human Rights Watch e lideranças democratas já indicaram que irão questionar a Casa Branca.

Trump sustenta que o barco afundado pertencia ao cartel Tren de Aragua, classificado como organização terrorista por Washington, e que, portanto, a ação teria amparo em precedentes da “guerra ao terror”.

O secretário de Defesa, Pete Hegseth, já anunciou inclusive que o Departamento de Defesa será rebatizado como Departamento da Guerra, reforçando a retórica de confronto.

O republicano afirmou ainda que o objetivo central é Maduro, a quem chamou de “chefão de um narco-Estado”. A linguagem de ataque direto ao presidente venezuelano acentua os temores de que a escalada vá além da narrativa antidrogas e se converta em uma tentativa de mudança de regime.

A crise tem impactos diretos na América Latina. O México já declarou que não aceitará ataques norte-americanos em seu território.

Em agosto, a CELAC aprovou uma resolução exigindo a retirada das tropas dos EUA do Caribe e reafirmando a região como Zona de Paz. Cuba e o PCdoB, no Brasil, também manifestaram solidariedade à Venezuela e condenaram a ingerência de Washington.

Analistas militares alertam que o desequilíbrio de forças é evidente. Os EUA dispõem de uma frota mais poderosa do que todo o arsenal venezuelano, mas Caracas aposta em estratégias assimétricas, como o uso de mísseis antinavio de tecnologia chinesa e iraniana.

O risco maior está em um disparo acidental ou ação mal calculada, capaz de transformar a atual escalada em confronto aberto.

O histórico recente indica que essa não é a primeira tentativa de Trump de pressionar o governo bolivariano. Em seu primeiro mandato, ele chegou a ensaiar uma operação militar com apoio dos então governos do Brasil e da Colômbia, mas sem êxito.

Mais tarde, tentou apoiar a oposição venezuelana, também sem sucesso. Agora, retorna com uma estratégia de força que ameaça desestabilizar todo o Caribe.