Sábado, 6 de dezembro de 2025
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Após o Tribunal Especial pela Paz da Colômbia (JEP, por sua sigla em espanhol) condenar 12 militares das forças armadas por assassinatos e desaparecimentos forçados de civis com penas máximas, na última quinta-feira (18/09), foram reveladas as sanções adicionais que esses sentenciados deverão cumprir, como a obrigação de auxiliar na construção de centros de memória e centros comunitários indígenas.

A decisão JEP sentenciou cinco oficiais, quatro suboficiais e três militares profissionais, todos aposentados, que pertenciam ao Batalhão de Artilharia nº 2 ‘La Popa’, de Valledupar.

De acordo com a Jurisdição Especial para a Paz, criada junto com o pacto com a guerrilha das FARC em 2016, espera-se que essas sanções permitam que os responsáveis ​​contribuam para a reparação das vítimas e para a construção da paz por meio de projetos que visem gerar benefícios reais para as comunidades afetadas, bem como a reintegração social dos que comparecem.

Vale lembrar que a JEP é uma entidade criada a partir do Acordo Final de Paz assinado em 2016 e que colocou fim à guerra civil que durou 56 anos, desde 1960. O cumprimento das suas sentenças contra pessoas envolvidas na guerra civil colombiana tem sido acompanhado por uma Missão de Verificação, enviada pela Organização das Nações Unidas (ONU).

Projetos restaurativos

Os trabalhos, projetos ou atividades restaurativas que os militares condenadas pelo tribunal pela paz colombiana devem realizar em conformidade com a sanção definida foram elaborados com a contribuição e consideração das vítimas.

Para definir e construir os projetos restaurativos, no caso dos crimes a que foram condenados os 12 militares das Forças Armadas, os juízes que compõem a Seção de Reconhecimento da Verdade consideraram especialmente os conhecimentos e costumes dos povos indígenas Wiwa e Kankuamo, bem como dos povos afro-colombianos dos Conselhos Comunitários Kusuto Ma-Gende e José Prudencio Padilla, para desenvolver os projetos restaurativos.

“As vítimas estão no centro deste processo. Suas contribuições e expectativas se refletem nas sanções. Nenhuma medida pode restaurar integralmente o que foi perdido ou atender a todas as demandas por verdade, mas esta decisão abre caminhos para a dignidade e a restauração. É mais benéfico para o país que os responsáveis não sejam confinados em prisões, onde a verdade e as possibilidades de reparação estariam trancadas, mas sejam forçados a responder às comunidades com ações restaurativas”, explica a juíza Ana Manuela Ochoa Arias, presidente da Seção de Reconhecimento da Verdade e que liderou a fase do julgamento.

Os seis projetos de restauração

Existem atualmente seis modelos de projeto sendo implementados na Colômbia. Um deles é o Plano Integral de Memorialização para a Costa Caribenha, que, entre outras ações, inclui a construção de um mausoléu memorial com 700 ossários e suas respectivas lápides no Cemitério Ecce Homo em Valledupar, Cesar.

Os aprovados deverão apoiar a construção, reformas e pintura; preparar e manter áreas para murais; identificar espaços e criar mapas; participar de projetos arquitetônicos e murais com as vítimas; apoiar processos de socialização, eventos e divulgação; e realizar a transcrição, digitação e produção de materiais educativos e de comunicação.

Outro modelo é o do Centro de Harmonização do Povo Kankuamo para uma Boa Vida, no qual os sancionados serão obrigados a realizar trabalhos de preparação e nivelamento do terreno; dar suporte às fundações e instalações de água, energia, conectividade e saneamento; fornecer equipamentos; construir e manter a estrada de acesso de laje; fornecer suporte logístico; instalar sistemas de irrigação e adaptar áreas de produção; e participar de atividades simbólicas de restauração.

Outra opção será o Centro Cultural e Memorial Abrangente do Povo Wiwa, que inclui preparar o terreno e os materiais; apoiar as fundações, erguer paredes, instalar acessórios e dar os toques finais; limpar, cuidar do jardim e fazer reformas externas; montar móveis; plantar árvores e hortas; construir trilhas e sinalização; entregar o centro cultural; e participar de atividades memoriais e comunitárias.

Já o Programa de Fortalecimento Produtivo Urbano e Rural Multiuso “Semeadores de Amor e Paz” prevê o apoio logístico e técnico para projetos de construção e infraestrutura; adequação de propriedades; sessões de trabalho de campo; e participação em encontros sociais e atividades simbólicas.

No caso das Casas Multiuso “Curando Memórias, Reconstruindo Vidas”, os sancionados serão obrigados a executar trabalhos de carpintaria, alvenaria e adaptação estrutural; fornecer manutenção de infraestrutura; fornecer suporte logístico para workshops, treinamentos e eventos; definir conteúdo; participar de eventos de reparação e reconhecimento; e desenvolver atividades comunitárias e memoriais.

Finalmente, o Centro Cultural Nelson Enrique Romo Romero inclui participação em estudos e projetos; apoio à construção, incluindo a pré-fabricação e posterior transporte até o canteiro de obras; instalação de mobiliário e equipamentos tecnológicos; apoio trabalhista e logístico; e participação em processos de socialização e atividades memoriais simbólicas.

Monitoramento e cumprimento das sanções

A imposição de uma sanção separada implica uma série de restrições aos direitos e liberdades que os condenados devem cumprir durante o período estipulado. Essas restrições incluem restrições à liberdade de movimento, escolha de residência, tipo de trabalho, permanência em locais específicos, participação em projetos restaurativos definidos na sentença durante o período estabelecido e cumprimento do regime de condicionalidades.

Para garantir o cumprimento adequado das sanções, existe o Mecanismo de Monitoramento e Verificação de Sanções (MMVSP), composto pela Secretaria Executiva da JEP, que monitora administrativamente o cumprimento da sanção; a Seção de Reconhecimento da Verdade, que realiza a supervisão judicial; e a Missão de Verificação da ONU na Colômbia, criada a partir do Acordo Final de Paz, que é responsável por monitorar o cumprimento por todas as partes envolvidas na implementação das sanções restaurativas.

A Seção de Reconhecimento da Verdade, além de verificar o efetivo cumprimento das restrições impostas aos condenados, também avalia se os benefícios podem ser revogados e modificados em caso de descumprimento.

Além disso, a verificação da conclusão das atividades e obras de restauração não será realizada apenas por meio de visitas presenciais. Também será implementado um sistema de monitoramento por meio de dispositivos eletrônicos, dando maiores garantias ao processo e permitindo o georreferenciamento dos envolvidos.

Os que comparecerem deverão iniciar o cumprimento das suas penas no âmbito do Plano Integral de Memorialização para a Costa do Caribe. O projeto incluirá um plano de segurança implementado pelo Ministério da Defesa e pela Subdiretoria do Sistema de Justiça Restaurativa, além do monitoramento mensal pelo Escritório Consultivo de Monitoramento Integral (OHIM, por sua sigla em espanhol), ligado ao JEP, em coordenação com o monitoramento estratégico do Mecanismo de Verificação da ONU.

A Organização das Aldeias Marubo do Rio Ituí (OAMI) apresentará um relatório sobre o cumprimento dos dois componentes da pena, incluindo as atividades realizadas, as condições de vida, a segurança e a restrição dentro dos perímetros determinados. Todos os que comparecerem contarão com uma apólice de seguro contra riscos e estarão vinculados ao sistema de saúde.

Magistrados definiram seis modelos diferentes de cumprimento de penas para militares condenados
JEP

Integrantes das FARC condenados

Em cumprimento ao Acordo Final de Paz, a JEP da Colômbia também emitiu no dia 16 de setembro sentença restaurativa contra sete ex-membros do antigo comando das extintas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – Exército do Povo (FARC-EP) pelos sequestros realizados no país.

Os sancionados das FARC-EP pela Seção de Reconhecimento da Verdade do Tribunal de Paz são Rodrigo Londoño Echeverri, Pablo Catatumbo Torres Victoria, Pastor Lisandro Alape Lascarro, Milton de Jesús Toncel Redondo, Jaime Alberto Parra, Julián Gallo Cubillos e Rodrigo Granda Escobar.

De acordo com o presidente da Jurisdição, o juiz Alejandro Ramelli Arteaga, a condenação dos ex-integrantes das FARC-EP representa um marco judicial na Colômbia, pois os réus nunca haviam respondido perante a justiça comum, nem haviam reconhecido sua responsabilidade pelos crimes cometidos.

O sistema de justiça também não havia documentado a magnitude dos crimes, a evolução das práticas, a dinâmica que as alimentou, os impactos psicossociais sobre as vítimas e suas famílias, os danos às comunidades e territórios e as políticas que os tornaram possíveis.

Além de ter a pena máxima por sequestros, a JEP determinou que os últimos integrantes do comando das FARC-EP devem trabalhar durante oito anos na busca por mulheres desaparecidas, em ações contra minas enterradas no solo, na proteção ambiental e em reparações simbólicas.

Conforme estabelecido no Acordo Final de Paz, os membros do secretariado das FARC-EP receberam sanções restaurativas após deporem suas armas, contribuírem para a verdade e reconhecerem sua responsabilidade por crimes de guerra e crimes contra a humanidade.

Sanções aos comandantes das FARC-EP

Os integrantes das FARC-EP deverão realizar trabalhos, projetos ou atividades durante oito anos – período máximo previsto no Acordo Final de Paz – para contribuir com a reparação das vítimas.
Como parte da sanção, foi inicialmente priorizado um projeto para buscar, identificar e restituir adequadamente pessoas desaparecidas no cemitério de Palmira, no Vale do Cauca. A JEP determinou que, além deste projeto, os desaparecidos desenvolverão outros projetos que serão implementados progressivamente até o cumprimento total da sanção.

Também foi priorizado um projeto de memória, no qual os participantes deverão prestar depoimentos dignos, começando nas cidades de Cali e Neiva. Esses projetos também incluirão tarefas operacionais, como transcrições, sistematização de informações e apoio na organização de eventos voltados à memória e à reparação simbólica das vítimas. Será solicitada ainda a participação em projetos de instalação de dispositivos memoriais.

Os condenados enfrentarão restrições em seus direitos e liberdades, incluindo aqueles relacionados à mobilidade, residência e trabalho. Serão obrigados a cumprir horários estabelecidos, permanecer em locais designados, estar sob monitoramento eletrônico constante e participar de projetos restaurativos durante toda a pena.

Os sancionados permanecerão sob um regime condicional que os obriga a continuar a fornecer informações sempre que solicitada, nas diversas investigações da JEP às quais permanecem vinculados por outros crimes cometidos durante o conflito.

As obras serão monitoradas pelo Mecanismo de Monitoramento e Verificação de Sanções, composto pelo JEP e pela Missão de Verificação da ONU. O governo nacional da Colômbia é responsável por garantir os recursos e medidas necessárias para a execução e execução da sanção.

Além disso, a seção emitiu ordens adicionais às entidades estaduais, incluindo a Unidade de Vítimas, para reavaliar a inclusão de vítimas em seus registros e, se necessário, permitir que elas tenham acesso a reparação administrativa.

Os julgamentos dos principais responsáveis pelos crimes ocorridos entre 1993 e 2012 contra a população colombiana vão continuar. Segundo a direção da JEP, outras se seguirão contra os responsáveis por blocos do extinto grupo guerrilheiro. Até o momento, 41 pessoas foram acusadas desses crimes, e todas admitiram sua responsabilidade pelos padrões documentados pela JEP.