Lydia Litvyak: A Rosa Branca de Stalingrado
Considerada a primeira mulher da história a abater uma aeronave inimiga durante um combate aéreo da Segunda Guerra Mundial
Há 82 anos, em 1º de agosto de 1943, a aviadora soviética Lydia Litvyak, heroína da Segunda Guerra Mundial, desaparecia em sua última missão. Ela tinha 21 anos de idade.
Após a invasão da União Soviética pelas tropas da Alemanha nazista, Lydia se voluntariou para servir na Força Aérea. Designada para o regimento de caças, ela se destacou como uma das pilotas mais habilidosas da história, aterrorizando os nazistas com suas manobras ousadas e estratégias engenhosas de combate. Era conhecida pelo apelido “Rosa Branca de Stalingrado”, evocando a pintura na fuselagem do seu avião.
Lydia foi a primeira mulher da história a abater uma aeronave inimiga durante um combate aéreo. Ao longo da Segunda Guerra Mundial, ela foi responsável por derrubar 12 aviões sozinha e outras quatro aeronaves em colaboração. Tornou-se, assim, a primeira mulher a ser creditada com o título de ás da aviação.
Quem foi Lydia Litvyak
Lydia Vladimirovna Litvyak nasceu em Moscou em 18 de agosto de 1921, filha da comerciária Anna Vasilievna e do ferroviário Vladimir Leontievich Litvyak. Cresceu em um período marcado por profundas transformações sociais e políticas, impulsionadas desde a Revolução de Outubro e consolidadas após a criação da União Soviética.
Desde criança, Lydia era fascinada pela aviação — um campo que estava em pleno desenvolvimento em seu país. A partir da década de 20, o governo soviético passou a fazer pesados investimentos na criação de uma indústria aeronáutica e na formação de pilotos, inaugurando uma extensa rede aeroclubes e escolas de aviação civil.
Em paralelo, o governo soviético mantinha uma série de políticas de incentivo à emancipação feminina, encorajando as mulheres a exercerem ofícios tradicionalmente vistos como masculinos — incluindo a aeronáutica.
Era a oportunidade que Lydia ansiava para concretizar seu sonho de voar. Aos 14 anos, ela se matriculou no Aeroclube Distrital de Kirov. No ano seguinte, Lydia realizou seu primeiro voo solo. Decidiu seguir carreira como pilota, ingressando na escola militar de aviação de Kherson, na Ucrânia.
Demonstrando enorme paixão pela profissão e talento para a pilotagem, Lydia se tornou instrutora de voo em uma escola de aviação de Tver, onde treinou mais de 40 pilotos. Ela também era politicamente engajada, participando das atividades do Komsomol, a União da Juventude Comunista.
A Segunda Guerra Mundial
Em junho de 1941, as tropas da Alemanha nazista invadiram a União Soviética durante a Operação Barbarossa. Era a maior campanha militar da história, congregando quase quatro milhões de soldados, 600 mil veículos e 2.500 aeronaves. A ofensiva seria devastadora, deixando um saldo de cinco milhões de mortos e milhares de cidades destruídas.
Reagindo à invasão, Moscou mobilizou seus militares e civis — incluindo as mulheres. A União Soviética foi o único país que permitiu a participação feminina em combate durante a Segunda Guerra Mundial. Mais de 800.000 delas atuaram no conflito, contribuindo em diversas funções, como atiradoras de elite, pilotas de avião, tripulantes de tanques e operadoras de artilharia antiaérea.

Lydia Litvyak (c. 1941-1943).
Autor desconhecido. Via Wikimedia
Lydia foi uma das muitas mulheres que se apresentaram voluntariamente para o alistamento na Força Aérea. Na primeira tentativa, ela foi recusada, sob a alegação de que não tinha muita experiência. Procurou então outro posto de alistamento e, dessa vez, mentiu no formulário, declarando possuir 100 horas a mais de voo.
A estratégia funcionou. Lydia foi admitida no 586º Regimento de Caças — um dos três regimentos exclusivamente femininos da Força Aérea Soviética. As três unidades foram criadas por iniciativa de Marina Raskova, a primeira mulher do país habilitada a pilotar aeronaves.
O regimento de Lydia tinha a missão de proteger instalações soviéticas e combater aeronaves alemãs. Além dele, havia o 587º Regimento de Bombardeio, empregado em missões de ataque ao solo, e o 588º Regimento de Bombardeio Noturno — o famigerado regimento das “Bruxas da Noite”, que realizava ataques noturnos precisos contra nazistas.
Primeiros combates
No verão de 1942, depois de concluir o treinamento a bordo de um Yakovlev Yak-1, Lydia iniciou suas primeiras missões de combate nos céus de Saratov. Em setembro do mesmo ano, ela foi designada para atuar junto ao 437º Regimento de Aviação de Caça, uma unidade mista que estava participando da Batalha de Stalingrado.
Em 13 de setembro de 1942, a bordo do seu Yak-1, Lydia abateu um bombardeiro alemão (um Junkers Ju 88) e derrubou um caça Messerschmitt Bf 109 que perseguia a líder do seu esquadrão, Raisa Beliaeva. Lydia tornou-se assim a primeira mulher da história da aviação a abater uma aeronave inimiga no ar.
O caça era pilotado por Erwin Meier, um renomado ás da Luftwaffe, a força aérea alemã. Meier saltou de paraquedas após sua aeronave ser abatida e foi capturado em solo por soldados soviéticos. O oficial nazista ficou incrédulo ao descobrir que seu avião fora derrubado por uma mulher.
No dia seguinte, Lydia voltou a abater um caça alemão pilotado por um ás. Ela derrubou o Bf 109 do tenente Hans Fuss, um oficial laureado com a Cruz de Cavaleiro, a mais alta condecoração da Alemanha nazista. Duas semanas depois, em 27 de setembro, Lydia abateu mais um bombardeiro Ju 88, possivelmente guiado por Johann Wiesniewski.
Em outubro de 1942, Lydia seria transferida para o 9º Regimento de Caças da Guarda, uma equipe que reunia alguns dos melhores pilotos soviéticos. Lá, ela serviu sob o comando do herói de guerra Lev Shestakov. Posteriormente, a pilota foi realocada para 73º Regimento de Caças.
A Rosa Branca de Stalingrado
Durante a Batalha de Stalingrado, Lydia participou de inúmeras missões de escolta, proteção de bombardeiros e combates aéreos diretos. Ela se consolidaria como uma das mais talentosas pilotas de caça do país, destacando-se pela capacidade de realizar manobras ousadas e pelo excelente desempenho nos combates curtos — as chamadas “dogfights”.
Lydia ganhou o respeito de seus companheiros na Força Aérea e o status de heroína, recebendo o apelido de “Rosa Branca de Stalingrado”, em referência à flor branca pintada na fuselagem de seu Yak-1.
Em 23 de fevereiro de 1943, Lydia foi laureada com a Ordem da Estrela Vermelha, uma das mais altas condecorações soviéticas. Posteriormente, ela receberia a Ordem do Estandarte Vermelho e a Ordem da Guerra Patriótica.
Lydia foi promovida a subtenente e a líder de seu esquadrão. Ela era tão habilidosa que o comando soviético a designou como “Livre Caçadora”, concedendo autonomia plena para que a pilota procurasse alvos por iniciativa própria.
Foram vários os testemunhos de inteligência, coragem e perícia que Lydia deu ao longo da Segunda Guerra. Em março de 1943, ela encarou sozinha uma formação de caças Bf 109 para proteger seus companheiros durante a execução de uma missão. Lydia ficou gravemente ferida no embate, mas conseguiu se desvencilhar dos inimigos.
Dois meses depois, Lydia impressionou todo o seu esquadrão ao destruir um balão de observação da artilharia alemã durante a Batalha de Kursk. Vários pilotos soviéticos já tinham tentado eliminar o balão, mas todos foram repelidos pela densa barreira de fogo antiaérea.
Para resolver o problema, Lydia voou em um arco longo e se aproximou do alvo pelo lado oposto ao esperado pelas defesas alemãs, conseguindo destruir o balão com uma rajada de munição traçante. A façanha lhe valeu uma segunda medalha da Ordem da Guerra Patriótica.
Em meados de 1943, Lydia sofreria duas perdas que a abalaram profundamente. Em 21 de maio, seu noivo, o piloto Aleksey Solomatin, outro herói de guerra soviético, morreu quando seu avião caiu no vilarejo de Pavlovka. E em 19 de julho, a pilota Yekaterina Budanova, a melhor amiga de Lydia, foi morta em combate.
A última missão
Ao todo, Lydia executou 66 missões de combate, abatendo sozinha 12 aviões e derrubando outras quatro aeronaves em colaboração com seu esquadrão. Ela foi a primeira mulher da história a ser consagrada como “ás da aviação” — título dado aos aviadores militares que conseguiram abater cinco ou mais aeronaves inimigas em combates aéreos.
Lydia permanece até hoje como uma das únicas duas mulheres classificadas como ases da aviação. A outra é sua amiga e companheira de esquadrão Yekaterina Budanova.
Em 1º de agosto de 1943, durante a Batalha de Kursk, Lydia voou em sua última missão. Ela estava escoltando bombardeiros soviéticos quando foi atacada por um grupo de caças alemães. Lydia enfrentou oito caças Bf 109 sozinha, em uma tentativa de proteger seus companheiros. Seu avião foi atingido e ela não conseguiu retornar à base.
O piloto soviético Ivan Borisenko voltou ao local para tentar encontrá-la, mas não havia aeronaves, paraquedas ou vestígios de explosão. O governo soviético chegou a suspeitar que Lydia poderia ter sido capturada pelos nazistas.
Em 1979, pesquisadores encontraram os restos mortais de uma pilota não identificada que fora sepultada no vilarejo de Dmitrievka. A análise forense comprovou que a ossada pertencia a Lydia. A aviadora tinha apenas 21 anos quando faleceu.
Lydia Litvyak foi postumamente homenageada com o título de Heroína da União Soviética. Um filme sobre sua vida está sendo produzido pelo diretor russo Andrey Shalopa, com lançamento previsto para 2025.























