Sábado, 6 de dezembro de 2025
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Os primeiros civis drusos conseguiram deixar a cidade no domingo (20/07). Eles fugiram dos combates e das atrocidades, muitas vezes após testemunhar a morte de familiares e amigos. As autoridades sírias iniciaram, nesta segunda-feira (21/07), a retirada de famílias beduínas de Sueida, graças ao cessar-fogo anunciado no sábado (19/07) que encerrou os confrontos intercomunitários que deixaram mais de 1.100 mortos.

Os primeiros civis drusos a deixar Sueida formavam um pequeno grupo, composto principalmente por mulheres e crianças. Nenhum deles está ferido, mas todos estão profundamente traumatizados. Eles estão refugiados em escolas ou prédios públicos na fronteira da província, onde aguardam que a situação se estabilize.

Cerca de vinte mulheres dormem no chão de uma sala de aula empoeirada de trinta metros quadrados. A maioria perdeu tudo que tinha. Jamila, de 40 anos, morava no centro de Sueida e presenciou a morte do filho.

“Meu filho não era soldado. Era um simples civil. Ele trabalhava como cabeleireiro. Sua rotina era casa-trabalho, trabalho-casa. Nunca fez mal a ninguém. Por que esses grupos armados o mataram? Depois disso, roubaram nossas coisas e queimaram minha casa. Fomos deixados na rua”, conta Jamila.

Sentada ao lado dela, Suhad, de 83 anos, viu sua casa se tornar um cemitério. Homens vestidos com uniformes militares, que ela não conseguiu identificar, executaram todos os homens de sua família.

“Eu pensava que os grupos armados drusos nos protegeriam. Mas esses homens em uniforme mataram meus dois filhos e cunhados… todos executados na frente das crianças. Seis homens foram mortos naquele dia. E, mais tarde, meu último filho também morreu. Perdi sete membros da minha família”, relembra Suhad.

Dezenas de casas de civis foram queimadas e destruídas durante o conflito na região de Sweida, pelo menos 37 pessoas foram mortas

Os confrontos em Sueida entre drusos e beduínos, iniciados em 13 de julho, provocaram mais de 1.100 mortes, segundo o OSDH. Entre as vítimas, 427 são combatentes e 298 civis drusos
@ilketvcomtr / X

As mulheres, traumatizadas, estão protegidas pelas autoridades. Elas falam pouco e não se alimentam. O relato delas reflete uma realidade ainda difícil de interpretar nesta guerra descontrolada. Os civis pagam o preço por um caos que nem mesmo os líderes locais parecem capazes controlar.

Situação permanece precária

Após o anúncio do cessar-fogo, um primeiro comboio de ajuda humanitária foi autorizado a entrar na cidade, mas a situação no hospital de Sueida continua crítica. O doutor Hatem Al Mghwish, médico do estabelecimento, lembra o dia em que milícias tomaram o controle do local.

“Eles chegaram no dia 16 de julho no hospital e nos fizeram reféns, das 13h até 1h da manhã. Estávamos esperando a morte. A 1h da manhã eles ameaçaram: ‘vamos matar vocês, médicos e pacientes’. Não nos deixaram tratar de ninguém, nem dar remédios. Muitos feridos e outras pessoas internadas morreram. Vimos monstros, não humanos. Eles são impiedosos”, diz o médico.

Atualmente, “a situação no hospital é desastrosa”, descreve o médico. “É lamentável. Perdemos tudo. Ficaram apenas alguns profissionais, e precisamos de equipamentos e tratamentos adequados para os pacientes. Há muitos corpos no hospital. Os vermes invadiram o local. A situação é crítica, sem comida, água ou eletricidade”, denuncia.

Retirada de civis beduínos

A onda de violência em Sueida ocorreu após o massacre de centenas de membros da comunidade alauíta em março. Ela fragiliza ainda mais o governo de Ahmed al Sharaa, que se comprometeu a proteger as minorias da Síria, devastada por quase 14 anos de guerra civil.

O cessar-fogo anunciado no sábado pelas autoridades entrou em vigor no domingo, com a retirada de combatentes beduínos e de tribos sunitas de uma parte da cidade. Os grupos drusos retomaram o controle de Sueida.

O anúncio do cessar-fogo ocorreu algumas horas depois de uma declaração de Washington afirmando ter negociado uma trégua entre a Síria e Israel, que se comprometeu a proteger os drusos.

A trégua está sendo respeitada nesta segunda-feira, exceto por disparos registrados em localidades ao norte de Sueida, indicou o Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH). Com o fim dos confrontos, as autoridades sírias começaram a evacuar famílias beduínas da cidade de maioria drusa.

Um correspondente da AFP viu civis, incluindo mulheres e crianças, saindo de Sueida em ônibus fretados pelas autoridades e em veículos particulares. De acordo com a agência oficial Sana, 1.500 pessoas de tribos beduínas devem ser evacuadas.

Saldo de vítimas

No domingo (20/07), o primeiro comboio de ajuda humanitária, levando alimentos, material médico, combustível e sacos mortuários, entrou na cidade de aproximadamente 150.000 habitantes, que estava sem água e eletricidade e onde começava a faltar comida.

Os confrontos em Sueida entre drusos e beduínos, iniciados em 13 de julho, provocaram mais de 1.100 mortes, segundo o OSDH. Entre as vítimas, 427 são combatentes e 298 civis drusos, dos quais 194 foram “executados sumariamente” pelas forças governamentais. Os confrontos também deixaram 354 membros das forças governamentais e 21 beduínos mortos.