Em 2005, a junta militar que governa a Birmânia surpreendeu e confundiu o mundo ao transferir o centro administrativo do país da velha capital colonial, Rangum (ou Yangon), para o interior, fundando uma nova capital chamada Naypyitaw.
Os generais não se dignaram a explicar as razões da misteriosa mudança, mas supõe-se que se sentiram mais protegidos contra a ameaça de manifestações populares na nova capital-fortaleza. Talvez eles até estivessem pensando na proximidade do 20º aniversário dos protestos de 1988 contra o governo, que sacudiram Rangum e deixaram milhares de mortos.
Os atuais governantes da Tailândia deveriam se inspirar no vizinho e transferir a capital de Bangcoc: eles teriam uma razão melhor do que os colegas birmaneses. Os manifestantes conhecidos como “camisas-vermelhas”, da oposição, ocupam há dias o centro comercial de Bangcoc, fechando bancos e lojas – e até invadindo o parlamento.
Há apenas alguns meses, a situação era inversa: milhares de opositores de camisa amarela ocuparam as sedes do poder, forçando o então primeiro-ministro Somchi Wangsawat a fugir do país. A Tailândia chegou a ser governada a partir da sala VIP do velho Aeroporto Don Muang. Mais tarde, os manifestantes ocuparam os dois aeroportos da capital, bloqueando o movimento de milhares de turistas e empresários.
Os tribunais tailandeses desqualificaram vários aliados de Somchi no parlamento, até que o governo perdeu a maioria. Isso permitiu que o atual primeiro-ministro, Abhisit Vejjajiva, do Partido Democrata, formasse um governo.
Abhisit deveria levantar acampamento, deixar a sede do governo e Bangcoc e levar com ele o máximo de ministros que conseguisse para um lugar mais seguro. Talvez devesse estabelecer-se temporariamente mais ao norte, nos territórios mais calmos de Chiang Mai ou Nakhon Savan.
Ao contrário da Birmânia, a Tailândia é uma democracia, ou pelo menos uma espécie de democracia entre um surto e outro de regime militar. Sempre que tiveram a chance de votar em eleições livres nos últimos cinco anos, os tailandeses apoiaram claramente partidos políticos associados ao primeiro-ministro Thaksin Shinawatra, derrubado em um golpe militar em 2006.
A elite e as classes médias de Bangcoc simplesmente não aceitam esse resultado. Por isso, ao se reunir ou tentar governar o país a partir da cidade, os políticos pró-Thaksin, quando estão no poder, atuam essencialmente no coração do território inimigo.
É verdade que há muita insatisfação com o governo de Thaksin. Ele até pode ter sido corrupto, tolerado uma cruel campanha extrajudicial contra narcotraficantes e inflamado, em vez de amenizado, a insurgência no sul. No entanto, ele é um herói para muitos tailandeses, como o único político que se preocupou com suas necessidades.
Exemplo real
Voltando à questão da mudança da capital: a Tailândia teve várias capitais desde o surgimento de uma identidade siamesa distinta, há cerca de 1.200 anos. Bangcoc sediou o governo durante pouco mais de 200 desses anos, depois que os birmaneses capturaram e arrasaram a ex-capital Ayutthaya.
Os políticos poderiam seguir o exemplo de seu querido rei Bhumibol, que tem reinado de seus vários palácios espalhados pelo país. Nos últimos anos, o rei tem permanecido a maior parte do tempo na cidade costeira de Hua Hin, cerca de 200 quilômetros ao sul de Bangcoc, indo à capital só para participar de grandes cerimônias e, ultimamente, para tratamento médico. Antes disso, passou vários anos em seu palácio em Chiang Mai.
Houve um tempo, na década de 1970, em que o governo considerou espalhar alguns ministérios pelo país, incluindo alguns em Hua Hin. Em algumas áreas dessa pequena cidade, ainda é possível ver espaços demarcados para os futuros prédios do governo, que só agora começam a ser substituídos por empreendimentos imobiliários.
Imitar o Brasil
O governo poderia reinstalar a capital no coração do velho Sião, nos arredores das antigas cidades de Sukhotai ou Phitsanulok. Ou poderia imitar outros países, como o Brasil, que transferiram a capital da zona costeira para o interior, em Brasília, a fim de incentivar o desenvolvimento de regiões empobrecidas. Isso poderia significar a construção de uma capital inteiramente nova na região nordeste, conhecida como Isan.
É fácil prever que os investimentos em infraestrutura que acompanhariam a construção de um centro administrativo totalmente novo no coração de Isan poderiam estimular a economia local e amenizar o ressentimento da população local em relação a Bangcoc, que poderia continuar como a capital comercial.
No momento, as duas forças da Tailândia parecem ter chegado a um impasse. A mudança da capital, ou até mesmo a ameaça da mudança da capital, poderia virar o jogo (para usar o atual americanismo). De qualquer modo, o governo teria uma razão muito melhor para fazer isso do que os generais tinham na Birmânia.
*Todd Crowell é jornalista, ex-editor do Asia Times em Hua Hin, na Tailândia, e atualmente reside no Japão. Artigo originalmente publicado no website Real Clear World . Tradução: Alexandre Moschella (Opera Mundi).
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