Sábado, 6 de dezembro de 2025
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Duas semanas atrás, a oposição comemorou uma vitória na Câmara dos Deputados na questão do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Dormiu celebrando, tomando uísque no gargalo, e acordou com a ressaca de ver o governo tomar as rédeas do debate político no dia seguinte. Como escrevi aqui, estava jogando alto e arriscando perder tudo.

Seria ingenuidade achar que os Estados Unidos arriscam perder tudo jogando contra o Brasil. A disparidade de forças é grande o suficiente para não haver risco de perder tudo – pelo menos no curto e médio prazo, ainda que a ação possa vir a alimentar um avanço na aliança do Brasil com China e Rússia.

Mas o gesto de Trump, que pode ter consequências significativas para a economia brasileira, mostrou que Jair Bolsonaro jogou mais alto que a oposição e ele, sim, arrisca perder tudo.

Bolsonaro e sua família pediram a intervenção do governo dos EUA, na tentativa de barrar o processo que deve levá-lo à cadeia pelas tentativas de golpe de Estado no final de 2022 e início de 2023. Conseguiu: a carta de Trump é inequívoca, pois atende a essa reivindicação.

Ou seja, os Bolsonaros jogaram alto e receberam o que pediram. Se os EUA têm pouco a perder, o tremor de terra atinge o Brasil em cheio. Não se trata de uma carta contra Lula e o PT, mas de um ataque frontal, pesado e inequívoco ao Brasil.

Ao se posicionar ao lado da extrema-direita brasileira, Trump reage às articulações da política externa brasileira, sobretudo ao resultado da cúpula dos Brics – que, de algum modo, apontou um avanço na consolidação do bloco, apesar das ausências de Vladimir Putin e Xi Jinping.

Para os EUA e seu tacão imperialista, o recado está dado, e o Brasil precisará demonstrar alguma unidade para, como se diz no boxe, “encaixar o golpe”. A reação pronta de Lula, dizendo que o Brasil reproduzirá a alíquota absurda, é mais do que adequada: é a única politicamente aceitável de um presidente de uma República minimamente autônoma.

Carta de Trump a Lula, impondo o tarifaço. Casa Branca/Reprodução

Carta de Trump a Lula, impondo o tarifaço. Casa Branca/Reprodução

O ônus da confusão, no entanto, deve cair sobre Jair Bolsonaro. Uma coisa é trair a democracia – algo grave, mas que, infelizmente, tem seu apelo popular. Outra é pedir sanções contra o próprio país e conseguir.

Bolsonaro já é o maior traidor do povo brasileiro no século XXI. Mas se candidata a garantir a medalha de ouro na história do país desde sua independência.

Trump põe fogo na política brasileira e sai rindo à toa

Enquanto isso, Trump, como todo bilionário, representando um país triliardário, ri à toa. Põe fogo na política brasileira, atrapalha a política externa brasileira e ainda conta com um laranja para assumir a culpa tanto no cenário nacional quanto internacional.

Lula, por sua vez, tem um problema complexo para resolver, que é reduzir os danos econômicos (com ou sem a efetiva implementação do tarifaço, prevista para 1º de agosto) e manter a cabeça erguida. Se assim se mantiver, ganhará apoio popular mesmo que nem tudo dê certo.

Até o momento em que escrevo este texto, mesmo a mídia tradicional parece mais alinhada com a defesa do Brasil do que preocupada em culpar Lula.

É certo que não faltará, sobretudo nos setores dependentes dos Estados Unidos (agro e capital financeiro), quem queira culpar o presidente da República Lula e Alexandre de Moraes pelos arroubos de Trump e pelos apelos de Bolsonaro para que os norte-americanos prejudiquem o país.

Nas ruas, no entanto, o provável é que Lula conquiste admiradores entre muitos que estavam jogando pedras em seu governo.

E, na seara da economia internacional, uma palavra basta para dizer quem vai trabalhar forte para que se encontre uma saída para o caso: China.