Sábado, 6 de dezembro de 2025
APOIE
Menu

A viagem da secretária de Estado dos Estados Unidos, Hillary Clinton, à América Latina foi principalmente uma visita de rotina a aliados e uma chance de fortalecer as relações com os presidentes recém-eleitos da Costa Rica, Uruguai e Chile. No entanto, quando ela chegou ao Brasil, a agenda se expandiu para incluir questões bilaterais, regionais e globais, da segurança na região – com a liderança brasileira na Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti – à energia e ao comércio, assim como as ambições nucleares do Irã e as esperanças da ONU de refreá-las. O tipo de discussão reservada a potências globais.

Para quem acompanha os assuntos da América Latina, essa visita (adiada, entre outros motivos, pela lentidão do Senado na confirmação da equipe do governo para o Hemisfério Ocidental) já deveria ter ocorrido. Para um crescente número de aliados comuns no hemisfério, o gigante sul-americano suplantou os EUA no papel de nação indispensável. Contudo, mais que a visita de Hillary ao Brasil, é a incursão de Lula no caldeirão geopolítico do Oriente Médio que indica, como observou nesta semana Michael Shifter, do Diálogo Interamericano, que “o país do futuro” chegou.

Leia também:

Israel face à sua história

Os fuzis da senhora Clinton

Governo de Israel ofende o povo brasileiro

A visita de Lula a Jerusalém e arredores teve toda a pompa de uma visita do líder de uma grande potência. Mas também foi um pouco diferente. Ele transitou entre Israel e os territórios palestinos, falou na Knesset (Parlamento) e visitou o Memorial do Holocausto, Yad Vashem. Mas, talvez encorajado pelo recente confronto entre Israel e os EUA por causa dos assentamentos, Lula não se acanhou: depois de depositar uma coroa de flores no túmulo de Yasser Arafat, pediu a suspensão da construção de colônias e censurou a violência israelense contra a população civil de Gaza e a barreira de separação erguida pelo Estado judeu.

Dos palestinos, o presidente brasileiro apenas exigiu “passos corajosos” rumo à paz. Aparentemente, os israelenses não acharam que ele saiu da linha (o ministro do Exterior, Avigdor Lieberman, boicotou seu discurso na Knesset, mas qualquer observador da política israelense sabe que Lula só tem a agradecer por isso).

Na verdade, a pedido de Lula, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu aceitou manter conversações bienais entre os dois governos e reuniões mais frequentes com economistas de ambos os países.

Por outro lado, enquanto os negócios são, sem dúvida, um grande motivo para esta visita e as próximas viagens ao Irã e à Síria, Lula e o Brasil também buscam conquistar um papel global no qual assumam a responsabilidade que acompanha o poder – incluindo o poder de mediar a paz. O mundo, disse o presidente, precisa “da intervenção de novos elementos, e podemos ajudar nisso”.

Lula está certo: o mundo realmente precisa de “novos elementos” para resolver problemas. Como ele disse depois da visita a Israel e aos territórios palestinos, “não há nada neste mundo que não possa ser consertado”. Seu comentário não é despropositado e a ascendência do Brasil não é resultado de seu carisma. Lula segue décadas de tradição de liderança ao guiar o país mais rico e populoso da América Latina num esforço para promover a cooperação pragmática e o compromisso pacífico na região. Como indica seu papel de manter a paz no Haiti antes do grande terremoto, o país conta com a confiança de vizinhos próximos e distantes.


Boas vindas ao Brasil

E agora o Brasil eleva as apostas com um papel de mediação progressista na questão do Irã e também no Oriente Médio. Isto só pode ser positivo. Com os outros países do Bric e do G-20 assumindo um papel mais significativo nos assuntos globais (note-se, por exemplo, as discussões sobre as mudanças climáticas em Copenhague há poucos meses), deveríamos dar as boas-vindas ao Brasil como um sério mediador da paz.

Não que Lula vá exercer um grande impacto imediatamente. Mas a fórmula do Quarteto está envelhecendo e poderá desaparecer com o tempo. E o esperado papel dos EUA de “intermediários honestos” está praticamente paralisado por um Congresso que tem uma definição diferente para essa expressão. Assim, com o passar do tempo, por que o Brasil – que os EUA veem como um parceiro muito mais confiável do que a China ou a Rússia – não deveria desempenhar um papel proeminente?

Durante a visita de Hillary, ela e o ministro das Relações Exteriores brasileiro, Celso Amorim, assinaram acordos sobre o avanço da mulher, o desenvolvimento econômico, a saúde, a inclusão social e as mudanças climáticas. Além disso, adicionando apoio doméstico à expansão da atuação responsável do Brasil na região, existem cerca de 10 milhões de brasileiros de origem árabe, assim como uma pequena, mas muito ativa minoria de judeus.

O Brasil é um aliado indispensável, ao qual os EUA não podem ditar ordens, como indica sua resistência a apoiar sanções contra o Irã. Mas o país tem muito a oferecer aos EUA em questões de segurança global e paz. Bem na hora em que o mundo está ficando mais complicado.

*Tom Garofalo é consultor da Iniciativa de Política EUA-Cuba da New America Foundation e escreve no blog The Havana Note. Artigo originalmente publicado no Foreign Policy

Siga o Opera Mundi no Twitter

Lula chega ao palco do Oriente Médio

NULL

NULL

NULL