Sexta-feira, 12 de dezembro de 2025
APOIE
Menu

Leon Russell, norte-americano nascido em 1942, atravessou a década de 60 como exímio músico de estúdio, presente em gravações para lá de históricas, ao lado de nomes como Jerry Lee Lewis, Bob Dylan, Phil Spector, Beach Boys e Rolling Stones. A partir de 1970, lançou discos individuais moldados em rock’n’roll, country, blues e gospel. Mas foram vozes outras que fincaram para sempre no cancioneiro pop dos Estados Unidos suas A Song for You (gravada por Cher, Carpenters, Willie Nelson, Aretha Franklin, Temptations e dezenas de outros), Superstar (Joe Cocker, Carpenters, mais recentemente Sonic Youth) e This Masquerade (Aretha Franklin, Carpenters, Sergio Mendes, George Benson).

Elton John, inglês nascido em 1947, deslanchou carreira solo em 1969, para se tornar, ao longo da década seguinte, o artista mais popular do Reino Unido e, possivelmente, do mundo. A sequência de hits melódicos, às vezes xaroposos, foi fulminante: Skyline Pigeon (1969), Your Song (1970), Rocket Man (1972), Crocodile Rock, Candle in the Wind, Bennie and the Jets e Goodbye Yellow Brick Road (1973), Island Girl (1975), Don’t Go Breaking My Heart,Crazy Water e Sorry Seems to Be the Hardest Word (1976), Blue Eyes e Empty Garden (1982), I Guess That’s Why They Call It the Blue (1983), Sad Songs (1984), Nikita (1985)…

Leia mais:

O que aconteceu com David Bowie?

Janelle Monáe discute guerras frias e quentes do pop atual com “Cold War” 

As maravilhas banais da família de Jimi Hendrix  

Christina Aguilera, do Clube do Mickey ao Clube Militar 

Novo CD do LCD Soundsystem ataca fãs e heróis do espaço pop  

Orgia ou romantismo, o que Kylie Minogue está propondo? 
 

No encarte de seu mais novo álbum, Elton conta que em 2009 pegou-se chorando convulsivamente ao ouvir um disco antigo de Leon. Ato contínuo, procurou saber por onde andava aquele artista tão peculiar, e a busca culminou nesse The Union, um CD inteiramente gravado em dupla, que marca o retorno de Leon às águas do chamado mainstream, devidamente paramentado com seus habituais cabelos e barbas brancos e longos.

Reprodução



The Union, de 2010, uma parceria que marca o retorno de Leon

Elton revela que, à parte o oceano de distância, Leon sempre foi um de seus heróis musicais – “foi minha maior influência no final dos anos 60 e no início dos 70, do ponto de vista do piano e dos vocais”, afirma. Deu-se com ambos uma história mais que comum no mundo da música. Inicialmente era Elton que seguia as pegadas de Leon, como pianista, melodista, cancionista. Mas foi o pupilo que ganhou o mundo, enquanto o influenciador pouco a pouco submergia. O resgate de um Leon Russell um tanto debilitado é, portanto, mais que um tributo prestado por Elton John. É um acerto de contas, tão justo quanto raro (apesar de Elton soar ríspido no encarte, quando trata Leon como “alguém voltando não da morte, mas quase da morte”.

O tratamento de gala ao ídolo caído é dado também por outros nomes míticos daquela geração, que unem-se ao condutor Elton John no esforço recompensador: o produtor T-Bone Burnett, o músico soul Booker T. Jones e, em participações especiais, Neil Young (em Gone to Shiloh) e Brian Wilson (em When Love Is Dying).

O encontro não é gentil para com anfitrião. Em vez de rejuvenescer o combalido pioneiro, Elton é que soa também debilitado na presença de Leon. Mas que não se atribua à proximidade do senhor de barbas brancas a voz cansada do amigo da princesa Diana – não é de hoje que também o discípulo deixou de surfar nas cristas das maiores ondas. Fragilidade por fragilidade, The Union faz-se um trabalho de profunda tristeza, perceptível desde os títulos (There’s No Tomorrow, I Should Have Sent Roses, When Love Is Dying e In the Hands of Angels), até a textura esfumaçada das próprias canções.

A melancolia e o desalento, no entanto, ultrapassam os currais respectivos dos dois artistas e extravasam no forte simbolismo provocado por Elton, do reencontro ultramarino, de papéis invertidos, entre um porta-voz musical jovial do país ex-colonizador e um anjo caído da ex-colônia que ficou mais famosa e inchada que a terra velha. A vontade de olhar para além do horizonte marítimo deve querer dizer algo mais que o mero confronto entre dois respeitáveis senhores.

*Pedro Alexandre Sanches é jornalista e crítico musical. Escreve no Opera Mundi e no seu blog pessoal.

Siga o Opera Mundi no Twitter 

Conheça nossa página no Facebook

Havia um Oceano Atlântico de distância entre eles dois

NULL

NULL

NULL