Hassan Nasrallah: o mártir que se tornou eterno
Hassan Nasrallah partiu, mas não foi derrotado. Assassinado por Israel, ele é agora a lembrança viva de que povos que se levantam nunca serão vencidos
O 27 de setembro nos traz a lembrança do martírio no ano passado do secretário-geral do Hezbollah, Seyyed Hassan Nasrallah, e a certeza de ele não foi apenas um homem. Foi uma voz que incendiava corações, um líder que transformava medo em coragem e dor em esperança.
Seu nome, que significa “vitória por meio de Deus”, tornou-se bandeira para os povos oprimidos e maldição para seus inimigos. Ele partiu aos 64 anos, martirizado pelos mísseis israelenses em setembro de 2024, mas sua ausência física apenas ampliou sua presença: Nasrallah vive agora como símbolo eterno de resistência.

O ex-secretário-geral do Hezbollah, Hassan Nasrallah, morto em 27 de setembro de 2024 por ataques israelenses.
(Foto: Khamenei.ir)
Nascido em 1960, em uma família xiita humilde no leste de Beirute, encontrou cedo no estudo religioso e na fé xiita um caminho para servir a seu povo. Inspirado pelo imã Musa Sadr, foi a Najaf, no Iraque, onde mergulhou na tradição do seminário islâmico e conheceu Abbas Al-Moussawi, irmão de luta e de destino.
Quando a repressão do regime iraquiano o obrigou a voltar ao Líbano, já trazia em si a semente de uma convicção inquebrantável: a resistência era um dever, e não havia outro caminho senão enfrentá-la.
Em 1982, após a invasão israelense, Nasrallah e seus companheiros romperam com o Movimento Amal e fundaram o Hezbollah. Não buscavam cargos, palácios ou poder, mas dignidade. Com armas simples e uma fé sem limites, começaram a escrever uma história que mudaria o equilíbrio de forças no Oriente Médio.
Aos 32 anos, quando Abbas Al-Moussawi foi assassinado, Nasrallah assumiu a liderança. Jovem demais, diziam. Ingênuo demais, previam. Mas ele provou ser mais do que um líder: tornou-se comandante, estrategista, guia espiritual e, acima de tudo, a voz firme que ecoava em cada lar libanês, em cada campo de refugiados palestinos, em cada coração árabe sedento de justiça.
Sob sua condução, o Hezbollah transformou derrotas em vitórias. Em 2000, forçou Israel a retirar suas tropas do sul do Líbano, uma vitória histórica celebrada em todo o mundo árabe.
Em 2006, na Guerra dos 33 Dias, enfrentou o “exército invencível” e mostrou que a arrogância militar pode ser desfeita pela fé, pela organização e pela coragem de um povo.
Nasrallah não era apenas um líder militar. Era o orador que falava com a autoridade da verdade. Até seus inimigos o escutavam, porque sabiam que sua palavra não era vaidade, mas compromisso.
Para seu povo, era um irmão que compartilhava sacrifícios: quando seu filho Hadi caiu em combate, ele mostrou que a resistência não era retórica, mas sangue derramado em nome da liberdade.
Nos últimos anos, seu compromisso com a Palestina se intensificou. Em outubro de 2023, colocou o Hezbollah na linha de frente em apoio a Gaza. Para Nasrallah, a causa palestina não era distante, mas parte inseparável da identidade da resistência libanesa.
O inimigo acreditou que matando o homem mataria a causa. Na madrugada de 27 de setembro de 2024, despejou sobre Beirute dezenas de mísseis, toneladas de explosivos, tentando apagar de uma vez por todas a chama que Nasrallah acendera. Mas não se mata uma ideia. Não se destrói um legado com fogo e ferro.
Milhões foram às ruas, do Irã ao Iêmen, do Iraque à Palestina. Líderes religiosos e políticos exaltaram sua vida, e sua imagem passou a tremular em bandeiras, estampada em murais, carregada por multidões.
O assassinato apenas confirmou sua imortalidade: Nasrallah deixou de ser apenas um homem e se transformou em mártir, símbolo eterno da luta contra a opressão.
Ele ensinou que a dignidade não se negocia. Que a justiça não se pede, se conquista. Que resistir não é opção, é destino. Sua voz ainda ecoa, sua presença ainda guia, seu legado ainda inspira.
Hassan Nasrallah partiu, mas não foi derrotado. Ele é agora uma chama que nenhum míssil pode apagar, um horizonte que nenhum inimigo pode alcançar, a lembrança viva de que povos que se levantam nunca serão vencidos.
(*) Sayid Marcos Tenório é Historiador e Especialista em Relações Internacionais. É fundador e vice-presidente do Instituto Brasil-Palestina (Ibraspal). Autor do livro Palestina: do mito da terra prometida à terra da resistência (2. Ed. Anita Garibaldi/Ibraspal, 2022).























