Como os planos anteriores que envolveram trilhões de dólares do contribuinte, as propostas desta semana do governo Obama para enfrentar a persistente crise econômica farão pouco mais que cutucar a ferida. Mais uma vez, a estratégia é estimular a economia financiando projetos e cortes de impostos, mas ignorando a causa primordial do problema: uma onda de execuções hipotecárias que congelou os gastos da maioria dos consumidores norte-americanos.
Com 11 milhões de proprietários de casas devendo mais que o valor de mercado e outros três milhões com suas hipotecas já executadas, temos de considerar, dado o tamanho médio das famílias, que cerca de 40 milhões de norte-americanos sentem-se terrivelmente apertados. Os números crescem para uma maioria esmagadora quando levamos em conta a angústia de todos os proprietários, que assistiram ao pé-de-meia da família minguar mesmo tendo abatido substancialmente ou quitado sua hipoteca. E esta exata sensação generalizada de estar mais pobre de uma hora para outra é um flagelo nacional que reduz dramaticamente o apetite de consumo, motor da economia.
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Este fato é reconhecido até mesmo pelos empresários que supostamente serão inspirados a investir e contratar pela proposta de Barack Obama, anunciada quarta-feira, de um incentivo fiscal acelerado para os investimentos empresariais. Como William Dunkelberg, economista-chefe da Federação Nacional da Empresa Independente, declarou ao Wall Street Journal, “se você der 20 mil dólares a um pequeno empresário, ele dirá: 'Eu poderia comprar um caminhão de entrega, mas não tenho a quem entregar'”. Embora uma redução de impostos agrade aos membros da federação, Dunkelberg disse que a ajuda mais importante seria “finalmente cuidar da pessoa mais importante na economia – o consumidor”.
A raiva dos aspirantes a consumidores que sentem ter perdido o poder de satisfazer a mais importante das paixões norte-americanas é o que alimenta a revolta generalizada contra os representantes eleitos. Os democratas, o partido no poder, são o alvo mais popular, mas entram em negação profunda ao culpar a demagogia dos oponentes republicanos por seus futuros problemas eleitorais.
Os republicanos e seus patrocinadores endinheirados, é claro, são grosseiramente hipócritas quando culpam outros pelas terríveis consequências de décadas de lobby em favor da desregulamentação financeira radical. Desde a “Revolução de Reagan”, seu mantra foi “tirem o governo das costas das grandes empresas”. Assim que isso foi obtido e Wall Street desmoronou sob o peso da própria ganância, eles apoiaram George W. Bush no resgate dos patifes.
Mas a falha é claramente bipartidária. Foi Bill Clinton quem sancionou as leis de desregulamentação radical e foi Obama quem continuou a prática de Bush de resgatar os banqueiros, mas ignorar o sofrimento que seus pacotes de hipotecas podres causaram ao resto de nós. É por isso que o Fed presenteou os bancos com dinheiro sem juros para financiar suas novas aquisições e os deixou saudáveis novamente comprando mais de dois trilhões de dólares em títulos hipotecários podres e outros ativos duvidosos. Não surpreende que os banqueiros tenham embolsado esse enorme presente dos contribuintes, mas tenham feito muito pouco em troca, na forma de empréstimos e investimentos que diminuiriam o desemprego.
Isso nos traz ao atual e desastroso momento. O presidente que herdou uma profunda recessão iniciada 13 meses antes de sua posse é agora visto como um grande gastador “socialista” por ter seguido os passos de Bush, chantageado pela ideia de que o sistema inteiro ruiria se os banqueiros não fossem socorridos. A quantidade de dinheiro hoje disponível para que ele gaste sem disparar temores sobre o aumento da dívida é insignificante. A alocação de 50 bilhões de dólares para um programa nacional de infraestrutura a ser realizado ao longo da próxima década se mostraria insuficiente e tardia. Trata-se de uma miséria em comparação com os 350 bilhões de dólares em empréstimos e garantias a um só banco, o Citigroup, que ainda não cosegue ficar em pé sozinho.
Sobrou apenas um caminho para Obama, que é fazer agora o que ele deveria ter feito no início do mandato: abandonar a esperança de que os bancos vão ajudar voluntariamente os proprietários de residências desesperados e, em vez disso, promover novas regulações governamentais e mudanças na lei de falência a fim de obrigar os bancos a fazer acordos para manter as pessoas em suas casas. Pouco resta a falar além disso, porque, se o mercado habitacional – fundamento não só do sonho americano mas, sobretudo, da segurança financeira de uma nação de consumidores – não for restaurado, estaremos condenados a um longo e sombrio período de estagnação econômica, na melhor das hipóteses, ou a um grave declínio em uma sociedade perigosamente abalada.
*Robert Scheer é jornalista e professor, autor de The Great American Stickup: How Reagan Republicans and Clinton Democrats Enriched Wall Street While Mugging Main Street.
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