Sábado, 20 de dezembro de 2025
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Na que passou e neste começo de semana um pequeno terremoto
agitou o governo alemão. As forças mais à direita, representadas pelo
vice-chanceler Philipp Rösler, do FDP, e pelo primeiro ministro da Baviera (da
União Social Cristã, CSU, co-irmã da União Democrata Cristã da chanceler Ângela
Merkel), Horst Seehofer, começaram a falar abertamente de um endurecimento em
relação à Grécia. O vice-chanceler aventou a possibilidade de uma moratória ou
falência da Grécia em relação à sua dívida pública (movimento que agora atende
pelo termo “default” ou “reestruturação”), enquanto Seehoffer aventou a simples
possibilidade de expulsar aquele país da zona do euro.

A posição de Rösler aventava para a possibilidade (ainda no campo das
conjecturas) de que o FDP não venha a votar no Parlamento Alemão (Bundestag)
pela aprovação do novo pacote de ajuda à Grécia, da ordem de mais uma centena
de bilhões de euros, além de outra centena já comprometida. Essas declarações
públicas vieram na esteira de uma crise de confiança em relação aos bancos
franceses, que, com os alemães, estão entre os maiores credores da Grécia, no
caso do já esperado nessa altura “default”grego, discutindo-se muitas vezes o
quando isso deverá ocorrer.

A maré chegou a tal ponto que o Ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble
e a própria chanceler vieram a público pedir que membros do governo e da
coalizão se calassem sobre a possibilidade da falência, e desautorizaram
qualquer especulação no sentido de que o governo alemão encarava até mesmo uma
perspectiva de “autorizar” esse movimento por parte da Grécia ou sua saída da
zona do euro, retornando ao passado dracma.

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Há no ar o temor de que, se a Grécia declarar uma moratória ou a
impossibilidade de pagar o total de sua dívida, Portugal e Irlanda venham a
fazer o mesmo, seguidos por Espanha e Itália. Aí sim o sistema bancário europeu
balançaria, a maré montante da crise atravessaria o Reno e chegaria com fragor
à Alemanha de Frankfurt e Berlim, e a tsunami decorrente atravessaria o
Atlântico engolfando, mais uma vez, Washington e Nova York.

Em toda a celeuma, que semanalmente provoca crises de adrenalina em escala
mundial, ressalta-se a falta absoluta de alternativas de um lado ou do outro do
Atlântico. Até o momento ideólogos de direita na mídia e nas universidades
conseguiram criar um muro férreo em torno da idéia central de que a solução de
tudo parte, como item número um da agenda única, da contenção de despesas
públicas, da “independência” dos bancos centrais (como se isso existisse), e,
portanto, que a solução passa pela privatização incontida e incondicional dos
bens públicos capazes de tornar o Estado um vetor de desenvolvimento, pelo
corte substancial nos investimentos, sobretudo os sociais, e pela dispensa e
arrocho em relação aos trabalhadores e aposentados do setor.

Nada há que se contraponha a essa maré de idéias que já não deram certo em
várias partes do mundo, mas que são fáceis de defender, mesmo sem argumentos,
porque se apóiam numa espécie de “senso comum” de que um estado robusto é um
“gigante de desperdício”. Não estou me referindo a campanhas movidas por
extremas direitas dentro e fora da mídia, do tipo praticado pelos Tea Party e
Fox News, ou agências do Império de Murdoch; refiro-me ao consenso médio da
grande maioria de comentaristas econômicos, a editoriais e a dirigentes
partidários dos mais variados matizes, que nada têm a oferecer como
alternativas a essas mezinhas herdeiras do neoliberalismo. 

No pico desse círculo vicioso e viciado de idéias, os dirigentes financeiros da
Europa – nos governos e nas instituições privadas – chantageiam cada vez mais o
governo grego porque este ainda não demitiu o suficiente seus funcionários e
porque ainda não privatizou, na pressa desejada, os 50 bi de euros que ainda
tem por privatizar. A ameaça (que provocará uma hecatombe) é a de não entregar
as parcelas da ajuda prometida no tempo devido, para que, no fundo, a Grécia
possa repassa-las, em grande parte, aos bancos credores.

Quando se parte para alternativas partidárias, o campo fica confuso. Os partidos
socialistas ou social democratas se renderam à retórica do Consenso de
Washington há muito tempo, e agora não sabem como sair disso. Os Partidos
Verdes aderem mais e mais a uma espécie de “bio-capitalismo” que não confronta
o “disco rígido” do programa da financeirização da política, da produção e do
mundo.

No caso da Alemanha, voz isolada, a Linke prega, mais recentemente, uma
valorização da política, da distribuição mais eqüitativa de renda e da
democracia como alternativa às propostas de administração da crise baseada nos
princípios que construíram a própria crise. Essa é uma alternativa
interessante, mas que ainda está no balbucio, e a que falta necessárias
correntes de solidariedade e sustentação Europa afora(para dizer o mínimo),
pois os movimentos de trabalhadores, estudantes e aposentados na Grécia,
Portugal, Irlanda, parecem lutar sozinhos contra o consenso geral de que “eles
estão errados” e “defendem privilégios insustentáveis”, isto é, seus direitos
legalmente constituídos.

Diante desse quadro desolador, parece mentira, mas algumas idéias razoáveis
aparecem… no campo do FMI! Como, por exemplo, a admissão (ainda feita a boca
pequena nos corredores) de que o “default” da Grécia pode muito bem ocorrer,
não por “incompetência” ou “vagabundagem” dos gregos, como quer explicar a
direita, mas simplesmente porque a dívida tornou-se impagável e honrá-la
significa, como vem acontecendo, prostrar a possibilidade de qualquer reação
pelo país.

Enquanto isso, na caluda e na moita, os chineses, que já arrendaram o porto do
Pireu, consideram a possibilidade de “comprar” a dívida italiana. Será?

*Flávio Aguiar é correspondente da Carta Maior em Berlim

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A crise do euro e a indigência de idéias

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