A África sofre com as mudanças climáticas de forma desproporcional
Séculos de colonização hoje dão ao continente africano, à Ásia e a América Latina o ônus da relação desproporcional entre desenvolvimento e impacto climático
O continente africano está esquentando mais rápido do que a média global. 2023, por exemplo, foi o ano mais quente já registrado ao longo da história recente do continente, batendo temperaturas recordes. Os climas extremos têm representado desastres físicos, sociais, econômicos e humanitários. Entre setembro e outubro de 2023, aproximadamente 300 mil pessoas foram afetadas por enchentes em dez países, sendo Níger, Benin, Gana e Nigéria os mais afetados.
“Enquanto muitos países no Chifre da África, sul e noroeste da África continuaram a sofrer secas excepcionais de vários anos, outros países experimentaram eventos extremos de precipitação em 2023, levando a inundações com vítimas significativas. Esses eventos extremos levaram a impactos devastadores nas comunidades, com sérias implicações econômicas”, disse Celeste Saulo, secretária geral da OMM, a Organização Meteorológica Mundial, de onde vem o relatório que embasa o presente artigo. As notícias não são boas para o mundo, mas em especial para o continente africano, onde perde-se entre 2 e 5% do Produto Interno Bruto (PIB) de cada país africano na resposta direta a eventos climáticos extremos. Na África Subsaariana, o custo da adaptação é estimado em algo entre 30 a 50 bilhões de dólares anuais na próxima década, ou 2% a 3% do Produto Interno Bruto da região, diz o relatório State of the Climate in Africa 2023 da OMM.
Até 2030, as estimativas apontam que cerca de 118 milhões de pessoas em pobreza extrema (que vivem com menos de 1,90 dólares por dia) serão impactadas por eventos extremos como inundações, seca, deslizamentos e ciclones, fogo descontrolado, entre outros, caso medidas seríssimas de prevenção não forem postas em prática. Somente neste ano de 2024, de acordo com a ONU, mais de 4 milhões de pessoas foram afetadas por inundações catastróficas na África ocidental, um número três vezes maior do que em 2023, piorando as crises humanitárias existentes nos países que foram mais impactados: Chade, Nigéria, Mali e Níger, países envolvidos em processos de luta contra a insurgência de grupos fundamentalistas islâmicos e, no caso dos dois últimos, que passam por governos militares anti-coloniais e se afastam cada vez mais da União Africana.
O continente africano tem se aquecido a uma taxa um pouco mais rápida do que a média global, em cerca de +0,3 °C por década entre 1991 e 2023. O investimento pesado em serviços meteorológicos e hidrológicos foi tema da 12ª Conferência sobre Mudanças Climáticas para o Desenvolvimento na África (CCDA) em Abidjan, Costa do Marfim, em 30 de agosto de 2024. Em seu discurso de abertura, o ministro do Meio Ambiente da Costa do Marfim, Jacques Assahoré Konan, ressaltou a magnitude da crise climática, afirmando que “combater as mudanças climáticas é o maior desafio que a humanidade enfrentou no último século”. Ele destacou o impacto desproporcional na África, que contribui com menos de 4% das emissões globais de gases de efeito estufa, mas ainda assim carrega o peso das consequências relacionadas ao clima. “A adaptação a esses efeitos adversos é uma grande preocupação para a África, e garantir financiamento adequado é fundamental.”
Cabe aos países do Norte Global as responsabilidades financeiras, sendo eles os maiores emissores de gases estufa do mundo, sobre os países do sul global que vêm sendo impactados negativamente com esses processos. No mundo capitalista, onde a ordem é a exploração dos recursos naturais e da lucratividade sobre o fator humano, séculos de colonização hoje dão ao continente africano, à Ásia e a América Latina o ônus dessa relação desproporcional, no entanto é também do sul global que surgem soluções e estratégias inovadoras para a preservação do meio ambiente.

Um garoto cuida do gado no condado de Samburu, no Quênia. 10/11/2024. (Foto: Africa Progress Panel / Flickr)
A crise climática é uma questão de justiça global. Os países mais ricos têm a responsabilidade de agir agora para proteger as comunidades mais vulneráveis e garantir um futuro sustentável para todos.
Para enfrentar essa crise, é urgente que os países ricos cumpram a meta de limitar o aumento da temperatura global a 1,5°C, aumentem o financiamento climático fornecendo mais recursos para ajudar as nações mais pobres a se adaptarem às mudanças climáticas e a se recuperarem de desastres. É preciso cobrar a Europa e os Estados Unidos que fortaleçam as medidas de adaptação investindo em soluções como a restauração de ecossistemas e o desenvolvimento de uma agricultura sustentável, além do cumprimento dos acordos internacionais como o Acordo de Paris, por exemplo, e que compensem as perdas e danos. Os países ricos devem ajudar as nações mais vulneráveis a lidar com os impactos irreversíveis das mudanças climáticas.
As mudanças climáticas trazem consigo um alerta crucial para que os líderes mundiais demonstrem compromisso com a ação climática. O futuro do planeta depende das decisões que serão tomadas nesta conferência.
Referências:
https://wmo.int/media/news/africa-suffers-disproportionately-from-climate-change
https://library.wmo.int/records/item/69000-state-of-the-climate-in-africa-2023
https://www.africanews.com/2024/09/20/torrential-rains-unleash-catastrophic-floods-in-west-africa/
https://www.aljazeera.com/opinions/2022/5/11/climate-change-is-devastating-the-global-south























