Sábado, 6 de dezembro de 2025
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As conversas sobre a resolução da guerra da Ucrânia voltaram à tona na política internacional. O novo plano de paz de 28 pontos apresentados pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, para encerrar a guerra da Ucrânia coloca o líder ucraniano, Volodymyr Zelensky, na berlinda em um momento de vulnerabilidade do seu governo, que internamente enfrenta um escândalo de corrupção que envolve aliados do mandatário.

Na última sexta-feira (21/11), Trump afirmou que as autoridades ucranianas terão que concordar com os termos do plano de paz. Caso contrário, Kiev será forçada a continuar as hostilidades, acrescentou.

“Acreditamos que temos um caminho para alcançar a paz. Ele [Zelensky] terá que aprová-lo. Em algum momento, ele terá que aprovar algo. Acho que a Ucrânia deveria se apressar e tomar uma decisão sobre o plano de paz; este será um inverno rigoroso”, disse Donald Trump, se referindo às dificuldades que o exército ucraniano pode enfrentar nos próximos meses.

A declaração de Trump aconteceu logo após um pronunciamento do presidente ucraniano no qual ele diz que o país se vê em um dilema diante da proposta dos Estados Unidos, representando “um dos momentos mais importantes” da história da Ucrânia.

“Agora a Ucrânia pode enfrentar uma escolha muito difícil: ou a perda da dignidade ou o risco de perder um parceiro-chave. Ou os difíceis 28 pontos ou um inverno extremamente difícil, o mais difícil de todos, e outros riscos. Uma vida sem liberdade, dignidade e justiça – e ainda ter que confiar em alguém que já nos atacou duas vezes”, disse Zelensky.

O plano de paz prevê o reconhecimento da Crimeia, Donetsk e Lugansk como territórios russos de facto, e a divisão das regiões de Kherson e Zaporizhzhia na atual linha de frente. O plano também inclui a “reintegração da Rússia à economia global”, medidas para restaurar a Ucrânia e a garantia de que o país não entrará na Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).

A pressão dos Estados Unidos sobre Kiev, no entanto, não foi um movimento isolado na última semana. Paralelamente à apresentação do plano, um escândalo de corrupção na Ucrânia veio à tona, envolvendo figuras próximas a Zelensky. Além disso, na segunda-feira (17/11), Donald Trump pela primeira vez apoiou diretamente um projeto de lei que prevê sanções a qualquer país que faça negócios com a Rússia.

Em entrevista ao Brasil de Fato, o cientista político e vice-diretor do Instituto de História e Política da Universidade Estatal Pedagógica de Moscou, Vladimir Shapovalov, aponta que a tentativa de pressão sobre ambos os lados faz parte da estratégia de Washington.

“Eu vejo isso como parte do processo de negociações. Por um lado, Trump faz pressão sobre Kiev, e o plano que agora está sendo ativamente discutido é em algum grau um passo significativo para frente da administração do presidente Trump de buscar compelir Kiev a chegar à paz. Paralelamente a isso, me parece que, por duas razões, novamente é retirada da gaveta e lançada a ideia de aplicar sanções contra a Rússia e seus parceiros”, afirma.

Enquanto isso, durante a última semana, o lado ucraniano também demonstrou uma mudança radical de posição. Em 12 de novembro, Kiev anunciou a suspensão oficial das negociações de paz com a Rússia, alegando ausência de avanços.

Zelensky tem sido criticado por movimentos locais ucranianos devido a escândalos de corrupção no país
Governo da Ucrânia

Subitamente, na terça-feira (18/11), Volodymyr Zelensky anunciou uma viagem à Turquia para “intensificar” as negociações para o fim do conflito. Neste meio tempo, foi revelado o plano de paz de Trump e o governo de Zelensky se viu diante de um grande escândalo de corrupção ligado à empresa estatal ucraniana de geração de energia nuclear, Energoatom, envolvendo o empresário Timur Mindych, considerado um aliado próximo do presidente, entre outras figuras de alto escalão.

A diplomacia russa não demorou para explorar o caso, insinuando o enfraquecimento da popularidade de Zelensky dentro da Ucrânia. Durante um briefing à imprensa na última quinta-feira (20/11), a porta-voz da chancelaria russa, Maria Zakharova, citou um estudo realizado em setembro deste ano pela empresa ucraniana Sociopolis que mostrou que “73% dos entrevistados acreditam que o nível de corrupção na Ucrânia aumentou significativamente nos últimos quatro anos”.

“Lembro que são quatro anos de guerra. Um quarto dos entrevistados culpa Zelensky e seu círculo próximo, e 19% culpam a Verkhovna Rada (Parlamento ucraniano). Sessenta e dois por cento apoiam a renúncia de Yermak da chefia do gabinete presidencial. Esses sentimentos já existiam antes dos escândalos atuais. Diante dos acontecimentos recentes, esses números podem ser muito mais negativos para o regime de Kiev. Fontes ucranianas já relataram que o ‘caso Mindych’ levou a um colapso na popularidade de Zelensky. Seu índice de confiança agora não ultrapassa 20%”, disse Zakharova.

Para o cientista político Vladimir Shapovalov, “não é por acaso que este plano aparece em um momento de vulnerabilidade do governo de Zelensky ligado ao escândalo de corrupção”. “Me parece que a equipe de Trump decidiu se aproveitar desta situação – o início do escândalo de corrupção – para exercer pressão sobre Zelensky”, completa.

Neste contexto, enquanto Moscou e Kiev analisam o plano apresentado por Trump, a Rússia mantém a sua ofensiva no campo de batalha conquistando novos territórios estratégicos no leste da Ucrânia, tornando a posição de Kiev ainda mais vulnerável. Se, por um lado, o presidente ucraniano, se encontra acuado diante da pressão exercida por Washington, a Rússia analisa com cautela os termos do acorda e observa a reação ucraniana.

O presidente russo, Vladimir Putin, durante uma reunião do Conselho de Segurança da Rússia na última sexta-feira (21/11), afirmou que o plano apresentado por Donald Trump poderia servir de base para uma resolução pacífica do conflito russo-ucraniano.

Putin observou que a Rússia recebeu o texto do plano, mas que ele ainda não havia sido discutido em detalhes com a Rússia, pois a Ucrânia ainda não havia concordado com as propostas. Segundo o presidente russo, o documento em discussão é uma “versão modernizada” do acordo discutido durante suas conversas com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, no Alasca.

O cientista político Vladimir Shapovalov destaca que a principal questão que influenciou na posição dos Estados Unidos de apresentar uma solução concreta é situação no campo de batalha, que continua sob o domínio da ofensiva russa.

O que mudou desde a reunião do Alasca e o período que se seguiu até agora? A Rússia reforçou a sua posição na linha de frente. Isso levou a uma nova posição dos Estados Unidos. Se esse processo de negociação se mantiver, e não é um fato que ele vai se manter, mas se continuar e não der resultado, na próxima vez, em alguns meses, quando a posição russa se fortalecerá ainda mais, e novamente haverá um retorno para esse processo de negociação. Então a situação anda em espiral”, completou.