'A Melhor Mãe do Mundo' é um filme sobre força e não violência
Dirigido por Anna Muylaert, longa retrata maternidade e violência doméstica com delicadeza e potência; filme estreou quinta-feira (07/08)
Em A Melhor Mãe do Mundo, a cineasta Anna Muylaert tece um drama social tão delicado quanto potente, protagonizado pela atriz Shirley Cruz em uma performance visceral. A diretora, que já explorou maternidade em produções como Que Horas Ela Volta? (2015) e Durval Discos (2002), apostou novamente no retrato íntimo de uma mãe que encontra forças para proteger os filhos. “É sobretudo sobre força, amor supremo, perseguir e ir em frente”, define.
O filme, que estreou na quinta-feira (07/08), abre com uma cena que poderia ser o fim: Gal, uma catadora de materiais recicláveis, denunciando o marido, Leandro (Seu Jorge), na delegacia da mulher. Mas, como a diretora explicou, a obra “anda no fio da navalha entre o lírico e a violência”.
A narrativa acompanha a jornada de Gal e seus filhos, Rihanna (Rihanna Barbosa) e Benin (Benin Ayo), pelas ruas caóticas de São Paulo, transformando o desespero em uma “aventura” para protegê-los.
Shirley Cruz descreveu o filme como uma história sobre “força, amor supremo e persistência”. Gal, mesmo sem recursos, cria um universo de afeto para as crianças – todas corintianas e que têm o desejo de conhecer o estádio em Itaquera, um detalhe que humaniza a família. Diferente do menino que entra na brincadeira da mãe, sua filha mais velha percebe que tem algo de diferente acontecendo.
A trilha sonora é outro elemento-chave: os sons traduzem a angústia da fuga e o ritmo frenético da cidade, compondo uma atmosfera sonora que dialoga com o estado emocional da protagonista. Muylaerte navega com precisão, entregando um drama potente e emocionante, que provoca reflexão sobre as múltiplas formas de violência contra a mulher e a força que nasce da urgência de sobreviver.
Através da fotografia detalhada e com um olhar sensível de Lílis Soares, é possível analisar a construção da narrativa em São Paulo, seja pelo risco de conduzir uma carroça nos acostamentos das grandes avenidas, o peso do trabalho em galpões cercados de concreto em ruas quase desertas e pelas praças onde, à noite, pessoas em situação de rua formam pequenas comunidades.

Shirley Cruz protagoniza uma catadora de latinhas que faz de tudo para tirar seus filhos de um ambiente violento
@bionicafilmes | Divulgação | Instagram
Apesar da temática do filme, não há cenas de agressão física ou sexual; as ameaças são insinuadas, e o terror se manifesta nos silêncios, nos olhares e na linguagem corporal da protagonista. Shirley Cruz constrói uma Gal perturbada e fragmentada, cujo corpo fala mais que suas palavras. “Seus olhos são a janela da alma”, comentou a diretora.
O filme explora o abuso da vulnerabilidade e escancara a invisibilidade das mulheres negras, periféricas e a naturalização da violência, mas evita discursos fáceis. A família de Gal, por exemplo, minimiza sua situação que é normal o marido trair ou agredir, enquanto a sociedade ignora sua existência.
Muylaert confirma seu olhar único para histórias marginalizadas. O filme não oferece respostas fáceis, mas celebra a resistência silenciosa de milhões de Gals brasileiras. Sendo um retrato daquilo que frequentemente está no nosso dia, mas que aprendemos a não ver.























