Sábado, 6 de dezembro de 2025
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No programa 20MINUTOS desta quarta-feira (17/03), o jornalista Breno Altman entrevistou a secretária-executiva do Foro de São Paulo, Mônica Valente. Ela explicou o funcionamento da articulação de partidos políticos latino-americanos e caribenhos, fundada em 1990 após a queda do Muro de Berlim, e analisou a atual onda progressista na região.

“A iniciativa foi do presidente Lula e do presidente Fidel Castro para unir partidos políticos que se opunham ao Consenso de Washington e buscassem uma ação conjunta da América Latina e no Caribe contra essa ofensiva neoliberal. O Foro é a resistência contra o neoliberalismo no continente”, explicou.

São cerca de quatro ou cinco partidos em cada país, totalizando mais de 120 legendas. Do Brasil, formam parte o Partido dos Trabalhadores, do qual a própria Mônica Valente é filiada; o PCdoB; o PDT; o PPS e o PCB.

Alguns partidos membros estão no poder, como é o caso na Argentina e no México. Outros não. A entidade também conta com aliados de outras regiões do mundo que participam de seus eventos, como o Partido Comunista da China, a Frente Polisário do Saara Ocidental e o Partido dos Socialistas Europeus. Na lista também se incluem movimentos sociais, como o Black Lives Matter.

“Mas a articulação é somente de partidos. Do México ‘para baixo’. Temos relações com grupos parlamentares nos Estados Unidos e no Canadá, mas eles não formam parte. Principalmente os EUA estão vivendo um processo político que não sabemos muito bem ainda onde vai dar, com o surgimento dos socialistas democráticos, como Bernie Sanders e Alexandria Ocasio-Cortez. Mas não os incluímos porque se aproximar a nós supõe, para eles, uma abertura a ideias que talvez ainda não estejam colocadas”, ponderou.

Além disso, o Foro não se propõe a criar um programa político, nem tem poder de decisão ou interferência nos partidos e países onde atua. Seu papel é gerar debates e buscar diretrizes conjuntas que guiem o trabalho de cada partido membro, e tudo por meio do consenso. 

O principal documento do Foro nesse sentido é o Consenso de Nossa América, no qual se estabelece a identidade programática da articulação e os princípios que ela estabelece para construir uma unidade na esquerda progressista latino-americana, antineoliberal e anti-imperialista. 

“Criamos em 2017 e continua bastante atual. Tem uma parte de diagnóstico de problemas, aponta estratégias no campo da economia, saúde, educação, cultura, entre outros. Então acho que é o que mais se aproxima de um programa, porque apresenta propostas concretas de alternativas ao neoliberalismo e ao imperialismo”, afirmou Valente.

Atualmente, o Foro se caracteriza por seminários e conferências virtuais, acompanhamento eleitoral e difusão de discussões de relevância continental que não recebem a visibilidade devida, como explicou a secretária-executiva.

“As vacinas cubanas, por exemplo. Cuba tem um desenvolvimento biotecnológico e na área da saúde reconhecido internacionalmente, mesmo com o bloqueio. Estão desenvolvendo a quinta vacina deles e já tem uma na fase três de testes. Cuba expressa um sentimento de solidariedade e humanismo para com o mundo muito relevante e se nós não dermos visibilidade para isso, ninguém mais vai dar”, defendeu.

Secretária-executiva explica a articulação e analisa o cenário político do continente; assista na íntegra o vídeo com a entrevista.

Falando sobre os bastidores do Foro, Valente contou que expulsões nunca foram feitas e que não são comuns dissidências, pois a articulação está acostumada a lidar com a pluralidade de pontos de vista dentro da esquerda.

A nova onda progressista

Analisando o cenário atual, Valente ponderou os motivos que levaram à derrubada da esquerda no continente. Ela reconheceu que foram cometidos erros, mas ressaltou a disposição dos adversários de partir para o uso da força e de métodos antidemocráticos para tomar o poder, citando como exemplo o golpe parlamentar no Paraguai e na Bolívia, o golpe militar em Honduras e o próprio golpe contra a presidenta Dilma Rousseff.

“Estávamos preocupados com governar e talvez não tenhamos atentado para os movimentos que os nossos adversários estavam preparando. Não são erros de traição do nosso ideário, são de ingenuidade política”, disse.

Sobre a nova onda progressista que vem se desenhando na América Latina, Valente diz não gostar dessa categorização, “porque a gente falava do fim do ciclo progressista para um ciclo conservador, que agora acaba, como se fosse uma lei da natureza. E não é. Daqui 20, 30 anos podemos fazer essa análise, agora é complicado. Mas há um desconforto importante com neoliberalismo”.

Segundo ela, o Foro vê com bons olhos a recuperação de governos de esquerda na Argentina, México, Bolívia e se mostra otimista com as eleições no Equador e no Peru. “Não significa, porém, que tenham acabado as tentativas de desestabilizar esses governos”, ressaltou.

Ela também ponderou que, no momento, a “onda progressista” se resume a poucos governantes, o que impede o pleno funcionamento de importantes órgãos latino-americanos, como o Mercosul.

“Mas é fato que o capitalismo está numa crise que vem se arrastando desde 2008 e que se agravou com a pandemia, pela hegemonia do capital financeiro. Até o Biden está investindo em políticas de renda mínima e recuperação econômica. Então nós do campo da esquerda temos que explorar essas contradições resolvendo as questões dos nossos povos. Acho que é o momento para que surjam alternativas ao capitalismo, mas não podemos achar que o sistema não vai procurar suas próprias soluções”, concluiu.